quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Seja o que Deus quiser

Várias frases e pensamentos postados no Facebook me deixam intrigados. Evito a “linha do tempo” da rede social, mas as vezes a curiosidade faz com que eu me depare com frases como esta, publicada por uma amiga: “Não sei os Teus planos Senhor, mas você conhece os meus caminhos.”

E então eu penso naquele mandamento que proíbe usar o nome de Deus em vão. Quando eu era pequeno, lembro que eu era repreendido se eu exclamasse algo como “Meu Deus, que calor!” Só poderia usar o nome Dele, se me referisse a Ele, ou estaria usando o nome Dele (escreverás o pronome em maiúsculo!) em vão. Por isso eu evitava, e me arrependia sinceramente quando a exclamação escapava sem querer.

Hoje penso nesse mandamento de uma forma diferente. Usar o nome de Deus em vão, creio, é achar que ele interfere em todos os aspectos da vida. Temos 7 bilhões de vidas no mundo para Ele dar conta. Mas insistimos em achar que foi Deus que não quis que fossemos aprovados no processo seletivo. Foi Deus que quis que você perdesse o ônibus. Foi Deus que levou o ente querido, ao mesmo tempo que salvou outro, nem tão querido assim.

E voltando à frase que abre o texto: será que Deus realmente planejou a sua vida? Cada detalhe? Desculpe-me se você crê que acontece assim, mas me parece muito cômodo, não? Se não deu certo, Deus que não quis. E a vida passa, e no final se percebe que Deus não quis nada grandioso para você. Será?

Nunca saberemos, eu sei. Não quero gastar meus 2 mil e poucos caracteres com reflexões que não levam a lugar algum e que podem ofender algum fervoroso leitor. Mas eu insisto em acabar o ano com essa ideia. 

Se me permite uma sugestão, não deixe a sua fé em algo maior se confundir com uma postura passiva. Está todo mundo esperando algo acontecer, alguma intercedência que coloque as coisas em ordem.

Espero que em 2015 seja como você quiser! Que seja algo bom para você, mas que influencie as pessoas do seu bairro. Coloque generosidade naquilo que você quer. Um exemplo: quer passar num concurso público? Não pense só na sua própria e melancólica estabilidade financeira. Comece implementando na sua rua coisas que você vai poder fazer pela cidade quando for aprovado no concurso. Isso se chama empreendedorismo. Se você quiser isso, acredito que Deus também vai querer.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

As relações comerciais em 2015

Provavelmente pouca coisa vai mudar na sua loja no ano que vem. Se você permanecer no mesmo ritmo, acredito que vá sobreviver – as mudanças tem sido lentas por aqui. Mas se você pensa em crescer, sugiro que pelo menos considere as ideias que apresento na sequência.

Sugiro que você capriche na experiência de consumo. O que seria isso? Sua loja, antes de tudo, precisa ser um lugar agradável. Ou responda: por que eu devo sair de casa e visitar você? O que existe na sua empresa que eu não consigo ter na internet? Eu sei que não é preço.

Eu também sei que seus vendedores são chatos, pois você exige que eles vendam tantos mil reais por mês. Eu desconfio que, assim que eu entrar na loja, eles não estarão preocupados em resolver o meu problema, já que o problema que você inventou para eles é maior que o meu. Sugiro que você repense a sua política de metas.

Também sugiro que o seu vendedor seja alguém que conhece aquilo que vende. O vendedor que tem lábia e enrola o consumidor é uma figura que ficou num passado distante, lá por 1997. Hoje, pesquisando alguns minutos no Google, eu sei mais do que ele. E ele insiste em fechar a venda, antes mesmo de entender exatamente o que eu preciso. Já pensou se ele fosse um especialista em apontar alternativas e soluções?

Hoje, metade dos americanos compram com o celular na mão, comparando preços. Isso já está acontecendo aqui. Estive em Nova York esse ano, na maior feira de varejo do mundo. Lá os varejistas colocaram sofás e internet liberada na loja. Ou você prefere que o cliente vá para casa pesquisar preços? Se ele for, você perdeu a venda.

Peter Drucker, o pai da administração moderna, dizia que só o marketing e a inovação dão resultados. E que todo o resto que você faz são custos. Você consegue questionar ele?

Logo, uma sugestão em marketing: relacionamento. Cadastre clientes e descubra quem são os melhores – os que gastam mais e com mais frequência. Crie um grupo VIP (quem sabe os 20% melhores) e trate essas pessoas especiais com personalização e exclusividades. E eles vão recomendar você.

E uma sugestão para a inovação: incentive a comunicação interna na sua empresa. O colaborador precisa ter a liberdade de questionar, de ser ouvido, de propor mudanças. Se a sua empresa fizer isso em 2015, eu volto no final do ano que vem com o próximo passo para a inovação. Mas se a sua empresa fizer isso, talvez nem seja preciso eu falar nada.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

A sua marca no Facebook

Há alguns dias um amigo colocou um anúncio curioso no Facebook. Não vou citar o nome dele para evitar constrangimentos, mas uso o exemplo como sugestões de o que não fazer na rede social.

Esse amigo tem uma empresa que vende um determinado tipo de produto. O primeiro erro dele foi criar um perfil ao invés de uma página no Facebook. Já comentei a questão nesse espaço: empresas não podem ter perfis de usuário, pois isso é proibido pelos termos de uso do Facebook (aqueles que ninguém lê, apenas clica em “aceitar”) Se você cometeu esse erro também, e criou um perfil para sua empresa, não se preocupe: é bem simples migrar de perfil para página. Você encontra o passo a passo facilmente procurando no Google.

Apenas adianto um ponto fraco da página: é mais difícil entrar em contato com um cliente, por exemplo. O Facebook só permite que a conversa comece pelo usuário, ou pela pessoa que curtiu a página. Eles fazem isso para evitar que as marcas fiquem atazanando você. A sugestão para o pequeno empresário é criar a página e usar o perfil pessoal para contatar alguém quando necessário.

O segundo erro desse amigo é mais específico: ele marcou em uma publicação quatro empresas, que são suas potenciais clientes, mas que são concorrentes entre si. Ele divulgou uma foto do produto e tornou isso visível para as quatro empresas – ao mesmo tempo. Ele poderia ter contatado facilmente cada um dos clientes: seria mais eficiente, mais personalizado (uma enorme vantagem das pequenas empresas) e evitaria esse peculiar constrangimento.

O terceiro erro dele aconteceu ainda na mesma publicação: ele escreveu a seguinte mensagem para as empresas clientes: “Venham nos visitar!” Ou seja: ele que é o vendedor, ele que oferece uma solução, mas ele quer que os clientes venham até ele! Esta é a característica menos aproveitada da rede social: o Facebook deve servir para divulgar conteúdo de qualidade, e não apenas ser usado como vitrine. Deve facilitar o contato e estimular a interação, e não só imitar a comunicação tradicional, onde o emissor fala e o receptor, se Deus quiser!, escuta.

Para concluir, uma breve reflexão. Caro empresário, vendedor, ou qualquer profissional que tem um perfil no Facebook: você é a sua marca por lá. Como essa marca é percebida? Ou será que as pessoas só estão rindo do seu amadorismo e dos seus erros de português?

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

A cultura empresarial simples

Há algum tempo ando muito interessado no assunto “cultura empresarial”. A maneira que as coisas são feitas em uma empresa indica se lá é um bom local para se trabalhar e se o ambiente é propício para a inovação. Da mesma forma, a cultura empresarial indica se o local tem funcionários felizes; se o cliente é a prioridade ou se é considerado um mal necessário. E você não precisa de muito tempo para perceber o que acontece: basta reparar em alguns detalhes, em algumas práticas, e você já tem uma ideia de todo o quadro.

Hoje quero chamar a atenção para alguns detalhes da cultura da Amazon, gigante mundial do comércio eletrônico. Lá funciona assim: desde o processo de contratação, procura-se deixar muito claro que as pessoas e a cultura são prioridade, quais são as regras do jogo e como as coisas são feitas. Você também deixa isso claro quando contrata alguém, caro empresário?

A Amazon classifica seus profissionais de duas maneiras: os “missionários”, que são aqueles que incorporam os propósitos da companhia e estão comprometidos com seus projetos, e os “mercenários”, aqueles interessados apenas em questões financeiras, de curto prazo.

Sabe como a Amazon faz para descobrir quem é missionário e quem é mercenário? Eles oferecem dinheiro para ver se os funcionários pretendem pedir demissão. Desta forma, ficam apenas os engajados, os que acreditam no futuro. E você, caro empresário, consegue identificar quem realmente é comprometido na sua equipe? Ou se você oferecesse algum dinheiro todos abandonariam o barco? E você, funcionário, largaria o seu atual emprego por quanto dinheiro?

Mais um exemplo da cultura da Amazon: a empresa pensou em uma série de procedimentos para não cair nas armadilhas burocráticas comuns nas grandes empresas. A Amazon quer permanecer enxuta e ágil, pois sabe que essa é a única maneira de permanecer inovadora. Para que isso aconteça, todas as equipes são “2-pizza teams”, ou traduzindo, duas pizzas precisam ser suficientes para alimentar toda a equipe de determinado projeto. Isso é cultura empresarial: uma regra facilmente entendida e que mostra como as coisas são feitas. Isso gera engajamento de funcionários.

E você, nobre empresário, saberia descrever, de forma simples, como é a cultura da sua empresa?

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

A Apple da China

O iPhone 6 (tela de 4,7 polegadas) e o iPhone 6 plus (tela de 5,5 polegadas) começaram a ser vendidos há alguns dias. No Brasil, o modelo mais barato custa em torno de R$ 3.000,00.

Toda vez que a Apple lança um produto novo, especialmente uma nova geração de iPhones, a expectativa é imensa. Milhões de fanáticos ao redor do mundo fazem fila e ignoram os preços para adquirir uma unidade o quanto antes.

A marca Apple é muito forte. A maçã estampada na traseira dos aparelhos é símbolo de sofisticação (aqui você escolhe, leitor, qualquer outro adjetivo). Em casos notórios como esse, a marca é o principal fator de escolha.

Este texto, no entanto, pretende chamar a atenção para outra marca, que emula o glamour da Apple no maior mercado consumidor do mundo: a Xiaomi (pronuncia-se xaumi), fabricante de celulares chinesa que se tornou há alguns dias a terceira maior fabricante de smartphones do mundo. Fica atrás da sul-coreana Samsung, primeira colocada, e da Apple, segunda. A terceira colocação veio em função de ser a mais vendida na China.

A marca é chamada (e a Xiaomi adora o apelido) de “Apple da China”, pois também possui clientes fanáticos que acompanham seus inventos tecnológicos. Os lançamentos dos produtos imitam todo o estilo da Apple: grandes eventos amplamente divulgados pela imprensa.

No entanto, o detalhe mais interessante (e que apavora a concorrência): os celulares da Xiaomi possuem tecnologia de ponta, semelhante aos concorrentes, e custam menos da metade do preço. É a competitividade chinesa que, em breve, deve mudar esse mercado absurdamente inflacionado pelo valor subjetivo das marcas.

A Xiaomi está investindo na expansão internacional, e quer entrar forte no Brasil em 2015.

Marcas ocidentais de tecnologia utilizam mão-de-obra e componentes chineses faz tempo. A própria Apple monta seus produtos na China. O que as marcas ocidentais temem (e já falei sobre isso neste espaço) é o momento em que as marcas chinesas vão ser respeitadas, também exercendo influência sobre o consumidor mundial na hora da compra.

Parece que este momento chegou. E o rótulo “Made in China”, outrora ridicularizado, nunca mais será o mesmo.



quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Os sonhos impossíveis

Há 20 anos Maria pensa em montar uma loja. Sua avó era costureira, e ela tem belas lembranças da infância, quando ajudava na venda e na entrega das peças. A avó faleceu logo após o avô. Segundo os familiares, não suportou a saudade - nada a ver com o câncer maligno. E a ideia de negócio desapareceu com ela. Maria, no entanto, mantém vivo o sonho de montar uma loja de roupas, exatamente como a sua avó queria.

João tem outro sonho: quer que o filho seja um doutor. Médico, se Deus quiser. Pode ser advogado também. João afirma que não teve oportunidade de estudar, pois teve que trabalhar desde a adolescência. Passou por muitas dificuldades em função da falta de estudo e dos consequentes trabalhos braçais. Mas, bem ou mal, sempre conseguiu manter a família. No entanto, imagina para o filho um futuro diferente.

Quantos Joãos e quantas Marias você já conheceu? Quantos desses sonhadores você já viu, que há anos vislumbram um futuro perfeito? Os sonhos são justificados, mas é preciso lembrar de um detalhe: o mundo mudou e vai continuar mudando. As pessoas também mudaram. E consequentemente a economia e o mercado de trabalho também estão completamente diferentes.

Maria está cega há décadas: acha que sabe fazer e vender o que o consumidor quer ou gosta. Não sabe que hoje, na mesa do jantar, a filha de 13 anos ensina a mãe como se vestir. Maria mal percebeu a força avassaladora do comércio eletrônico. E nem desconfia da irrelevância que algumas lojas assumiram, simples intermediárias expositoras de produtos.

E no caso de João? Será que percebe que formam-se inúmeros doutores, mas que poucos são bem sucedidos? Será que João entende que, ultimamente, o trabalho aumenta enquanto os empregos diminuem? Ou o pior: será que o filho quer ser um doutor? Será que o primogênito não tem um sonho mais forte que o do pai, mas é uma pessoa tão boa e grata que prefere seguir resignado o caminho imaginário desbravado no travesseiro?

É preciso entender melhor o mundo, ou um sonho antigo pode se tornar um pesadelo. A falta de informação gera negócios natimortos o tempo todo. Ou pior: já pensou o peso do seu desejo se tornar a miséria do seu filho mais querido?

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

A vitrine errada

Passou há pouco na TV uma reportagem sobre uma fiscalização que o Procon anda fazendo. As lojas que não colocarem preços em todos os produtos da vitrine serão multadas. E a multa é pesada: a mais leve custa 500 pilas.

Vou comentar a questão criticando um pouco o Estado e um pouco o varejista. 

Primeiro, o Estado: a ação do Procon está baseada no que diz o Código de Defesa do Consumidor. É a lei. No entanto, mais uma vez, o Estado acredita que o consumidor é um mentecapto: ele precisa, de acordo com a opinião desses especialistas em consumo, ser protegido do lojista malvado.

O Estado deveria concentrar esforços em punir práticas desleais e abusivas. Condenar o comerciante por não colocar o preço na vitrine (“vitrina” também é correto) é abusar do poder de fiscalização e menosprezar a capacidade de julgamento do consumidor.

A crítica ao comerciante: o senhor sabia que alguns consumidores não entram em lojas que não colocam preço na vitrine? Para o cliente, não colocar o preço é um sinal de que o produto é caro. 

Além disso, nesses tempos de falta de tempo, o preço na vitrine facilita a vida das pessoas. Se o cliente precisa entrar na loja para descobrir o preço e ainda ter que lidar com um vendedor xarope (entupido de metas financeiras), ele provavelmente vai optar por não entrar. E alguns lojistas ainda se espantam com o domínio do comércio eletrônico.

Outra questão: há alguns dias um comerciante reclamou que possuía muitos produtos na vitrine, e que era impossível colocar uma etiqueta com o preço em todos. É um caso clássico de procurar a resposta certa para a pergunta errada. A questão não é como colocar etiqueta de preço em tanta coisa. A questão é: será que é necessário colocar tanta coisa na vitrine?

Não é necessário e nem recomendável. A vitrine precisa sem simples, com pouca informação, constantemente renovada. Coloque só alguns itens representativos (lançamentos, promoções, você que manda!) e contrate vendedores que conhecem os produtos e que tem a capacidade de entender o problema do consumidor.

Vale a pena colocar o preço dos produtos da vitrine. E é a lei. E se você ainda acha que vai enganar alguém (cliente ou concorrente) com essa prática arcaica, precisa aprender um pouquinho mais sobre o comportamento do consumidor moderno.

quinta-feira, 23 de outubro de 2014

O empresário pródigo

Era uma vez um empresário. Varejista.

Teve dois filhos. O primogênito se criou dentro da loja. Ainda criança já era auxiliar, futuro gerente e sócio. Mas quando concluiu o ensino médio decidiu que iria para a capital. Queria ser ator, arquiteto, algo menos chato, segundo ele.

O pai teria lamentado mais mas não deu tempo. Muitos problemas para resolver: estoque, contas, impostos, inadimplência, devoluções. E o funcionário que ficou doente. E o caminhão que quebrou na estrada.

Fora as alegrias: nasceu a primeira netinha. Filha da filha mais nova, que também ajudava na loja.

Ah, e a esposa? Desde as primeiras vendas diretas, embriões do futuro ponto comercial, ela quem anotava tudo. Queria receber antes de entregar. Desconfiada, em certa noite de insônia ela perguntou ao marido se não seria uma boa ideia revistar as pessoas quando saem da loja. Inclusive aquele funcionário. O empresário acalmou a esposa. Em geral, ele disse, as pessoas são boas como você. E ela dormiu resignada.

Religiosamente depositava um dinheirinho na conta do filho. Perderam um pouco do contato que, na verdade, nunca tiveram. O filho vinha visitar a família duas ou três vezes por ano. Numa dessas trouxe um amigo. Para a irmã confessou que era o namorado. O pai nem desconfiou, pois nesse dia estava com a cabeça no Banco do Brasil.

A filha grávida de novo, deu no ultrassom: varão! O empresário e avô soltou dois foguetes, fez churrasco e ficou bêbado. Discutiu política e futebol com o genro. Contrariado, descontou no cachorro, que insistia em cercar a mesa. Apanhou de espeto e foi se esconder na casinha. A noite, na cama, não conseguia dormir de remorso. Foi lá fora e fez as pazes com o guapeca. Perdoado, voltou para a cama. 

O filho foi embora no outro dia. O pai levou ele e o amigo na rodoviária. Na volta passou na loja e viu que uma luz da vitrina estava desligada. Queimada, talvez? Parou o carro e foi resolver.

Assistiu ao jornal de domingo. Pescava de sono. A esposa foi deitar e ele foi atrás. Nunca soube interpretar o silêncio: era a terceira noite seguida que ela dormia sem dizer boa noite. Pensou em conversar. Mas capotou exausto, com um leve sorriso no rosto, imaginando o netinho usando o uniforme da loja.

O eleitor errado

Há alguns dias, em uma confraternização, ouvi o discurso de um senhor de uns 50 anos. Segundo ele, “político é tudo ladrão”. E que o certo seria “jogar uma bomba no congresso”. Entre outras ideias brilhantes. Já fui de discordar e tentar argumentar. Ou dependendo do humor apenas concordava para não perder o amigo. Hoje em dia, educadamente me retiro.

Claro que ele não era um terrorista. É só mais um que replica lugares-comuns. Não dá uma certa tristeza ver alguém com meio século de vida falando com a gravidade de um adolescente?

Para esta reflexão, não vou questionar se os políticos são todos ladrões. Vamos aceitar o fato de que isso é o que a maioria pensa. Logo, surpreende essa expectativa do povo de que o Estado – operado pelos políticos – vai salvar a nação. Se os políticos são corruptos, como confiar neles? Por que achar que o Estado vai proteger você e a sua família?

Se políticos são corruptos e não confiamos neles, deveríamos limitar seus poderes, certo? Ou o povo não liga para a corrupção e espera por alguém que “rouba mas faz”?

Para ilustrar, apenas um exemplo: as rodovias. Reclamamos que os políticos são corruptos, mas deixamos o Estado cuidar das estradas. As estradas do oeste de Santa Catarina são uma viagem em família, de Gol mil, ao Mato Grosso dos anos 1990. E morre gente o tempo todo. Muitas vezes a culpa é da imprudência, mas o ser humano é imprudente. O que estamos fazendo é uma mistura explosiva: imprudência com estradas destruídas. A imprudência não mata tanto em estradas boas.

Parece que seria mais coerente que o Estado apenas regulasse o trabalho de empresas privadas que construíssem e mantivessem as rodovias. Eu confio numa empresa que procura bons funcionários e que cobra resultados. Eu não confio em governos que escalam comparsas para administrar vidas.

O Estado, consequentemente, cobraria menos taxas de trânsito, e quem precisasse dirigir que pagasse pedágio. No sistema atual, todo mundo paga imposto para remendar rodovias – até quem nunca passa por essas estradas.

Opa, pagar pedágio? Eis o problema: diante da ameaça de assumir responsabilidades, os políticos nem parecem ser tão corruptos. E a estrada nem é tão ruim, dá para seguir viagem.



quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Um dia azul

Acordei às 6 da manhã do dia 9 de Outubro, tomei café e banho (nessa ordem) e fui do hotel ao aeroporto de Sinop (MT). O local se parece mais com uma rodoviária. As 7:30 da manhã o calor já era insuportável. Nenhum ar-condicionado funcionava.

O voo da Azul sairia de Sinop as 8:10 e chegaria, se tudo desse certo, as 9:10 em Cuiabá. Mas nada deu certo.

Eu precisava treinar uma turma a partir das 13 horas. Só depois das 10 da manhã um funcionário da Azul falou, no sistema de som mais ruim que eu já vi e ouvi, que o voo havia sido cancelado. E pediu para que todos se dirigissem ao balcão de check-in. Esse é o protocolo de um voo cancelado?

Nesse instante, toda a gentileza terminou: pessoas se atropelavam para pegar um lugar melhor na fila. Eu derrubei duas senhoras e consegui ficar lá pela metade. Estou brincando: fiz amizade com algumas pessoas e elas guardaram meu lugar na fila. Lá pela metade.

Um detalhe curioso: antes do aviso do cancelamento, os funcionários sumiram! Uma mulher desesperada entrou na área de check-in, e bateu várias vezes na porta: ninguém atendia. Estavam escondidos, provavelmente sem saber o que fazer. Ou era essa a recomendação da Azul?

O treinamento de Cuiabá foi cancelado. Tive que cancelar a passagem da Azul e comprar uma da Passaredo para chegar em Cuiabá em tempo do meu voo para Ji-Paraná (RO), cidade do treinamento seguinte.

Escrevo este breve relato durante esse último voo do dia. Agora faltam 15 minutos para as 23 horas do horário local.

Sei que essas coisas acontecem. No entanto, como consumidor, não questiono fatalidades, mas julgo a maneira que uma empresa resolve seus problemas. Difícil entender o que aconteceu com a equipe da Azul em Sinop. Eu admiro a Azul, e esse foi o detalhe: só nos decepcionamos com quem admiramos. Será que perdemos, assim como já se perdeu a TAM, mais uma companhia aérea focada na excelência dos serviços?

Essa história por pouco não teve um final diferente. Após essa manhã e tarde caóticas, o funcionário da Azul em Cuiabá me disse o seguinte, lá pelas 19 horas: “Sorte que você fez o check-in pelo celular. Ou não teria lugar para você no voo para Ji-Parana.” Nem respondi. Realmente foi sorte, pois não costumo fazer check-in pelo celular. O pior é que ultimamente o fator sorte tem sido decisivo nos aeroportos do Brasil.

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

O fator sorte

No livro “Como as gigantes caem”, o autor Jim Collins cita, como um dos motivos da quebra de empresas de sucesso, aquela confiança inabalável na própria capacidade.  A crença total em ser o único responsável pelo próprio sucesso. Ou melhor: a empresa (ou o profissional) que acredita que tudo que conquistou é resultado do próprio esforço, pode estar correndo um risco grande de cair.

Segundo o autor, uma postura inteligente é considerar que as coisas que deram certo podem ter sido lances do acaso. Você pode ter tido sorte. Ou você tem certeza de que o sucesso é resultado apenas do que você fez, dos seus atos? Simples assim, causa e consequência?

É bem característico dos tempos que vivemos: os gabolas de sempre falando que, quem quebrou, não se esforçou tanto o quanto eles. E pensam que, por talvez trabalhar com mais dedicação, não correm perigo. Condenam a postura errada do fracassado e acreditam que isso nunca vai acontecer com quem faz tudo certo. Ou supostamente certo.

Infelizmente não é assim: basta pensar na quantidade assustadora de eventos e situações que não controlamos. E quem sabe esses eventos ambientais e externos possam ter favorecido as circunstâncias e, talvez sem você perceber, encurtaram ou facilitaram o caminho das vitórias.

Tive um exemplo em casa: meu pai é promotor de justiça, e sempre atribuiu a Deus e à sorte ter conseguido chegar lá. Eu sempre discordei, pois acompanhei a sua impressionante dedicação aos estudos. Hoje entendo melhor essa humildade, e admiro tanto essa postura quanto o esforço que ele fez.

Uma postura elogiável é admitir que não se conhece a verdadeira razão do sucesso. Por mais que você tenha feito, aparentemente, tudo certo. Quem não tem esse excesso de confiança, segundo Jim Collins, é mais precavido.

Você não sabe se tudo o que você conquistou até hoje teve a sorte como ingrediente. Mas se você supor que a sorte fez parte do caminho, vai estar mais preparado para quando faltar sorte – e aí sim você vai perceber com clareza. E um detalhe: é preciso acreditar na sorte como ingrediente do passado, e não como algo que vai acontecer e resolver os problemas no futuro.


Resumindo: acreditar na sorte como ingrediente principal do sucesso adquirido é uma prática constante de humildade.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

O caçador de coincidências

Eu tento acreditar em algumas coisas, mas não é fácil.

Por isso tento ser meio (?) místico. Eu gosto de falar, por exemplo, sobre a Lua (é em maiúscula que se escreve?). Entendo as fases, os eclipses, o efeito gravitacional. Sei explicar de forma bem didática como a Lua muda a maré. Mas admito que é uma admiração forçada: eis a lua cheia e amarelada no horizonte. Paro o carro e observo. Acenderia um cigarro se eu fumasse. Com toda a força tento sentir algo. Mas não sinto. O astro que inspira os poetas, no caso, é só algo bonito. Só um ponto de vista. Tem um texto do Dalton Trevisan em que algum maníaco fala para alguma mocinha indefesa: “Você é a redonda lua cheia de olho amarelo que, aos cinco anos, desenhei na capa do meu caderno escolar”. Nada ainda.

Também gosto de falar sobre signos, mas por questão de bom gosto desprezo as previsões do horóscopo. Mas gosto particularmente da ideia de signo ascendente: uma fotografia do céu no instante em que você nasceu e que vai te influenciar a partir dos 25, 26 anos. Eu mudei muito nessa idade e por isso afirmo, canastrão: será que meu ascendente em Virgem, tão distante do meu signo de Peixes (no outro extremo do Zodíaco) realmente mudou minha personalidade? A história é boa, mas infelizmente não acredito. É só uma coincidência.

Mas não pense, caro leitor, que ser “só” uma coincidência seja motivo de pouco caso. Eu garimpo coincidências. Anoto. Coleciono. As coincidências tornam a vida menos banal, né?

Só que há alguns dias li que as coincidências não existem. Dizem que nos deparamos com mais de um milhão de pequenos fatos por mês. Dessa forma, seria normal que alguns desses fatos fossem espetacularmente parecidos, coincidentes. Um em um milhão, estatisticamente, pode acontecer uma vês por mês. Logo agora que eu estava começando a acreditar nas coincidências como manifestação do destino.

Enfim, continuo buscando algo para acreditar. E perdão, caro leitor, por hoje não falar em marketing, inovação e tal. É que este é o meu texto número 150 aqui no lucasmiguel.com. Como celebração a esse passado recente, resolvi escrever algo mais parecido com os textos que eu escrevia antes do signo ascendente me transformar nesse incrédulo faceiro.

E que outubro traga duas ou mais coincidências.



quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Os pesquisadores do futuro

O Ministério da Educação (MEC) divulgou essa semana o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). O resultado foi pior do que nas últimas edições: o ensino médio não progrediu, e 17 estados brasileiros recuaram. A média nacional é de 3,7 na escala de zero a 10. A média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 5,2.

Alguns dirão que esse fiasco é das escolas públicas e dos rincões abandonados pelos governantes. Também. Mas aqueles que deveriam ser nossos estudantes de ponta também andaram aprontando.

Os alunos brasileiros da Universidade de Southampton, do Reino Unido, receberam um e-mail que questionava a sua falta de dedicação como estudantes bolsistas do programa Ciência sem Fronteiras. Quem mandou o e-mail foi a instituição Science Without Borders UK (SWB UK), que cuida do programa na Inglaterra.

O e-mail enviado aos bolsistas afirma que o SWB UK foi "contatado pela Universidade de Southampton devido ao número considerável de reclamações das faculdades em relação ao comparecimento e à aplicação nos estudos". A instituição afirma que entende que a reclamação não se aplica a todos, mas diz que “gostaria de pedir que se esforcem mais e que cumpram todos os compromissos firmados.” Existe a possibilidade de os alunos terem que devolver o dinheiro que receberam do programa.

Uma reportagem do Brasil Post ouviu alunos brasileiros que receberam esse e-mail. Eis o depoimento de Denise Leal, estudante de engenharia civil: "Eu achei ofensivo ter recebido [a mensagem] porque realmente tive comprometimento com o programa, mas entendi a intenção deles. A maioria dos estudantes que estão participado do programa não se engaja muito porque o governo [brasileiro] não exige nada em troca. Não cobra nada! A gente foi meio que solto aqui. Quer estudar, estuda. Não quer estudar, viaja, porque o governo paga e não cobra resultado. O dinheiro dá e sobra, então eles preferem viajar e faltar às aulas porque não tem presença, chamada."

O governo federal já concedeu aproximadamente 100 mil bolsas para que universitários estudem no exterior. Isso é bom e necessário. O absurdo é não exigir nenhuma contrapartida dos beneficiados.

Nossa educação é muito ruim. Mas preocupante mesmo é a inconsequência e o descaso dos alunos. Aqui e lá fora.


quinta-feira, 18 de setembro de 2014

Economia de silicone

Para entender o impacto das situações econômicas podemos olhar para o passado. Um exemplo: a época da enorme inflação no Brasil. Se você ainda mora em uma casa que possui um cômodo chamado “despensa”, é provável que sua casa foi projetada nessa época. Na cabeça do arquiteto, era preciso que você possuísse um local para armazenar comida, e assim fugir do aumento constante dos preços.

Outro exemplo: provavelmente sua família já teve, e quem sabe ainda possui um velho freezer horizontal, que também servia, por exemplo, para estocar carne. Não que a nova geração não perceba os efeitos da inflação. Mas o cenário econômico não parece mais uma ameaça tão próxima quanto no passado recente. Hoje podemos pensar em investimentos produtivos com mais certezas – como, por exemplo, montar um negócio.
Desse modo, entender macroeconomia e suas influências se torna um exercício mais histórico. Ou de geografia: hoje, um ótimo exemplo é o que acontece na vizinha Venezuela.

O presidente doidivanas Nicolas Maduro, sucessor do tirano Hugo Chávez, vem adotando medidas que estão provocando escassez crônica de itens básicos de consumo. Falta papel, por exemplo: mais de dez jornais já encerraram suas edições impressas ou diminuíram a quantidade de páginas. Além de ser resultado da restrição da importação de papel, a medida é também um golpe direto para enfraquecer as críticas da imprensa. E um golpe indireto na população que continua indo ao banheiro. Se é que o leitor me entende.

Outra grande ideia recente de Nicolas Maduro: limitar a compra de itens básicos na rede privada de supermercados. Isso já acontece nos mercados públicos (a rede Casino foi desapropriada por Hugo Chávez em 2010). Ou seja: uma desastrosa política financeira penaliza sempre o consumidor.

Mas a melhor foi anunciada essa semana: falta silicone de qualidade no país, o que atinge seu principal – e talvez único – segmento de reconhecida qualidade mundial: as mulheres. A Venezuela ganhou 7 vezes o concurso Miss Universo (atrás apenas dos EUA, que ganharam 8). No mercado só há silicone chinês, de qualidade inferior, já que é proibido importar dos EUA ou da Europa.

Dito isso, uma boa pergunta para entender o conceito: como o cenário econômico afetaria sua vida se você fosse jornalista, varejista, cirurgião plástico ou um simples cidadão venezuelano?