quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Estereotiparam você também

Há alguns dias, ao chegar em Florianópolis, conversei um pouco com o taxista. Ele desabafou: o dia de trabalho estava difícil. Ele disse que havia se envolvido num acidente pela manhã. Enquanto ele falava sobre a confusão, algo me chamou a atenção. A pessoa do outro carro envolvido no acidente teria dito algo assim: “todo taxista é folgado!” 

E ele me disse que sofre no dia-a-dia com essa generalização. Desde passageiros achando que ele vai dar um jeito de cobrar mais, até outros motoristas preocupados com sua atitude no trânsito.

Isso acontece com quase todas as profissões: forma-se um estereótipo do profissional, e ele vai ter que lidar com isso na rotina de trabalho. Não importa se a pessoa é um motoboy em cidade grande ou se é um político em Brasília.

Vou aproveitar o tema para falar sobre um estereótipo que conheço bem: o de vendedor. Quem nunca ouviu a frase “ele sabe vender!” Em geral é usada para se referir ao vendedor que é quase um mágico – ele tem truques para persuadir o cliente. A propósito, se você procurar no Google, verá que existem inúmeros mágicos ensinando vendas.

Por isso, quando as empresas contratam vendedores, já procuram pessoas com esse perfil falador e desinibido. E aí começa o problema: os clientes conhecem bem esse perfil de vendedor. E hoje em dia, com as facilidades de tecnologia e entrega, muitas pessoas evitam as lojas porque sabem que é difícil argumentar com esses faladores. Mas a preocupação do gerente é com os números, não com a experiência de compra. O ponto de vista do consumidor é ignorado. Por isso, continuam contratando pessoas com esse estereótipo defasado de vendedor.

Eu imagino uma equipe de vendas diferente. Que ouça bem mais do que fala. Que pergunta mais do que responde. Que apresente um certo desapego da obrigação de venda. Com foco total no problema, na situação do cliente, e na melhor maneira de resolvê-la – pois sabe que isso é o que gera a transação financeira. Algo precisa ser feito para mudar aos poucos esse estereótipo do vendedor chato. Não é uma mágica que vai resolver.

Para concluir, uma pergunta ao nobre leitor: você sabe o que as pessoas falam sobre a sua profissão? Conhecer essa percepção pode ser a melhor maneira de se diferenciar.

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

É bom ou você acha que é bom?

Há alguns dias, o ator Antônio Fagundes fez a seguinte declaração no programa Roda Viva, da TV Cultura: “Se 30 mil pessoas pagam 750 reais para ver um cara bater no outro, o teatro é barato demais”. O ator se referia às lutas de MMA, o sucesso que conhecemos e que repercute em todo o mundo. E a comparação aconteceu porque o ator respondia a uma questão sobre o preço das entradas de peças de teatro, que por serem caras, afastariam o público.

Num primeiro momento, a vontade é de concordar com a comparação de Antônio Fagundes. E percebe-se que, indiretamente, ele quis dizer que o teatro vale mais do que a luta, especialmente se observados por uma escala de valores culturais.

Do ponto de vista cultural e artístico, Antônio Fagundes pode até ter razão. Mas do ponto de vista comercial, sua declaração é, no mínimo, ingênua.

Em primeiro lugar, nem toda peça de teatro é boa. Arrisco dizer que uma minoria vale a pena. Dessa forma, sair defendendo todas as peças de teatro é apenas corporativismo. O ator acredita que o que ele faz é mais nobre que outras atividades, e que o povo tem o dever de prestigiar, e não reclamar do preço. Mais ou menos como o empreendedor que acredita que o seu produto ou serviço é superior. E que o povo é que não entende. Antônio Fagundes acredita que falta cultura. Empreendedores acreditam que falta o quê? Propaganda?

Em segundo lugar, se você entra na questão de preço e venda, você saiu do campo artístico e está falando de negócios. Quem quer vender precisa entender que o que produz é para as pessoas, e não para materializar uma inspiração artística. Logo, é preciso fazer algo que as pessoas queiram porque é bom, não porque o iluminado acha que elas deveriam comprar. Uma inspiração artística, por melhor que o autor/ator ou a crítica acreditem que seja, não é garantia de sucesso comercial – por mais que eles afirmem (insisto!) que o povo tem a obrigação de prestigiar.

Creio que a salvação do teatro não está no preço ou na consciência cultural do público – está na qualidade das peças e dos atores. E a salvação dos negócios está na qualidade dos produtos, dos processos e das pessoas – e não na inspiração do empreendedor.



quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Inauguração vazia

Os empreendedores costumam supervalorizar o lançamento de seus negócios. Eles imaginam uma grande inauguração. Imaginam que vai ser o assunto da cidade. Gostariam que a imprensa cobrisse o fato. Mas não é mais assim que funciona.

Eu entendo o sentimento: empreender é difícil. E é motivo de orgulho para quem o faz. Mas existe um problema: em geral, as pessoas não ligam para o seu esforço. Em geral, as pessoas não ligam para a sua empresa. Você vai ter que falar, mostrar e provar que o que você faz é importante e relevante – para as pessoas. Para você, empreendedor, eu já sei que é importante. Mas eu, como consumidor: por que eu vou ir até a sua empresa, gastar meu tempo, ouvir a sua equipe e ainda gastar dinheiro? Preciso de um bom motivo.

Outro problema: os empreendedores querem que tudo esteja perfeito para a inauguração. Investem em decoração, placas, iluminação, fachada, móveis, a estrutura completa. Mas o perfeito não existe. É melhor lançar algo bom, ou até razoável, e construir o resto aos poucos. Em negócios, o perfeito costuma ser inimigo do bom.

Questiono com certa frequência, neste espaço, aquela ideia arcaica sobre empreender: muita gente ainda acredita que o primeiro passo é ter um bom ponto comercial. E então descobrir o que “dá dinheiro”, ou o que “ainda não tem” na cidade.

E então, depois de tudo, ou quase tudo do jeito que ele queria, abre as portas e espera as pessoas entrarem. A parte mais difícil costuma ser conquistar clientes: mas ela é considerada uma consequência do capricho inicial. Não é mais assim que funciona.

O ideal seria que o empreendedor fosse lançando sua ideia aos poucos.
Quem sabe já ir criando confiança antes da grande inauguração. Criando protótipos, amostras, testando produtos. Colhendo o precioso feedback dos clientes. É como o treino antes do jogo.

A inauguração pode ser comemorada. É interessante chamar a atenção, criar certa expectativa, gerar novidade. Mas isso precisa ocorrer na cabeça dos consumidores, e não na cabeça do empreendedor – ele precisa ter começado bem antes. Se não for por uma questão de estratégia de negócio, que seja para evitar um grande investimento inicial em algo incerto.

E que a inauguração seja muito mais um momento que marque a certeza – e não o primeiro passo rumo ao desconhecido.


quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Privações tecnológicas

Uma reportagem do Jornal Nacional mostrou o preocupante cenário do roubo de celulares no Brasil. Aproximadamente 3 mil celulares são bloqueados por dia no País – o proprietário pede o bloqueio para que ele não seja usado pelo bandido. Alguns, resignados e já cansados de tanta falcatrua em todas as partes, nem bloqueiam o aparelho perdido. Ou seja: é bem provável que o número de aparelhos roubados seja ainda maior. No máximo agimos como o Chaves, que foi à igreja rezar para que o ladrão (o Senhor Furtado) se arrependesse e devolvesse o ferro de passar da Bruxa do 71.

No passado recente, o medo era ter a carteira roubada. Esse tipo de ladrão sempre foi chamado de batedor de carteira. E o ladrão de celulares, já tem um apelido?

Minha irmã mora em Florianópolis e prefere não ter um celular muito bom. O medo de perder o investimento existe, mas é secundário. O medo maior é despertar a atenção dos ladrões. É passar pelo trauma de um assalto.

Perceba o dilema, caro leitor: não se pode usufruir totalmente de um benefício da tecnologia – ele precisa ser utilizado com cautela, já que a segurança pública não nos permite comprar, pagar e usar um celular aonde e quando a gente quiser.

Talvez em cidades pequenas o sumiço de smartphones não seja um problema tão grave. Mas vamos para uma tecnologia ainda mais cara, e que nos preocupa ainda mais: os automóveis. Também temos medo de usá-los. E nesse caso, o medo maior por aqui nem é o roubo: são as estradas destruídas. E nessa conta também entram os estacionamentos lotados e os congestionamentos.

E assim, em qualquer lugar, as necessidades de ir e vir e de se comunicar são impedidas. Reflexos da corrupção, da burocracia, da incompetência: sem infraestrutura e segurança, a tecnologia não anda.


E uma reflexão: será que a tecnologia traria boas soluções para sua empresa? Eu acredito que sim – especialmente na questão da comunicação. No entanto, se assim como o Brasil, a sua empresa também é burocrática e incompetente, a tecnologia não será aproveitada em todo o seu potencial. E em alguns casos pode até representar um retrocesso – desde um sistema complexo implantado para alguém que mal anotava no caderno, até o Facebook para quem não sabe escrever nem se comportar direito.


quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Disputando clientes

Conversando com minha mãe, uma consumidora, percebi um problema muitas vezes ignorado pelos lojistas. Como de costume, eles estabelecem uma comissão sobre a venda individual para os vendedores. É uma meta que precisa ser batida. Dessa forma, o vendedor se vê obrigado a vender, e o consumidor precisa se defender da abordagem insistente: o cenário comercial que conhecemos bem, e que já comentei aqui, em texto, várias vezes.

Ultimamente venho chamando atenção para outro detalhe: muitas vezes o problema não é o departamento comercial. É o produto. Simples assim: as pessoas não precisam do que você vende. O empresário precisa perceber isso logo, e mudar de rumo, quem sabe até de ramo. Mas muitos, míopes, insistem no esforço de vendas, nas promoções, e inclusive repensam as metas e comissões, tema deste texto. Transferem a culpa pela situação à equipe de vendas.

Vamos ao problema das cotas individuais de venda, mas sob aquela perspectiva da minha mãe: ela quer ajudar o vendedor. Já sabemos, e ela também sabe, que o vendedor ganha comissão. Então, quando entramos numa loja, procuramos o vendedor que nos atendeu no primeiro contato. Ou aquele vendedor que é um amigo. Ou aquele que eu prefiro. Porque não queremos que ele saia prejudicado.

Para a loja isso pode ser um problema, pois o cliente escolhe com quem quer comprar. E ele talvez faça isso apenas para ajudar, ou para ser justo. A culpa é da loja, que ao invés de estimular o trabalho em equipe e a padronização do atendimento e da experiência de compra, prefere cobrar desempenhos individuais.

A consequência é um processo de vendas bagunçado. Em geral, nessas lojas, o vendedor tem pouca autonomia. Quando treinado, é para aprender a oferecer produtos. Também em geral, o gerente é chamado para resolver qualquer situação que fuja do usual – desde uma troca ou devolução, até uma simples autorização de desconto ou parcelamento. Para que serve a equipe nesse cenário?


Não vou entrar de novo na polêmica de ter ou não ter cotas individuais de venda. Mas havendo a obrigação de vender, é preciso amenizar as consequências que isso traz: entre tantas outras, a mais clássica e até cômica, se não fosse trágica: vendedores disputando no tapa para atender bons clientes, enquanto ignoram aqueles que eles julgam serem clientes ruins.