quinta-feira, 26 de maio de 2016

Menos pizza e menos pessoas

Comentei aqui na semana passada (e em algum momento do passado) que Jeff Bezos, fundador da Amazon, criou o conceito “two pizza teams”, ou time de duas pizzas. Duas pizzas devem ser suficientes para alimentar a equipe. Se não for, a equipe está grande demais. Não compre mais comida.

A regra, além de ser usada para definir o tamanho máximo das equipes de trabalho, também serve para facilitar e fomentar a comunicação entre os integrantes. Dessa forma, um time da Amazon contém entre 5 e 8 pessoas.

Hoje, gostaria de explorar outros benefícios além da comunicação, comprovados em estudos acadêmicos, de trabalhar em equipes pequenas.

Quando um grupo é muito grande, os membros do grupo reduzem seus esforços porque se sentem menos responsáveis pelo resultado. Se você está sozinho na rua, e vê um idoso sendo assaltado, você vai sentir uma grande responsabilidade de ajudar. A vítima só tem você para acudi-la. Se você não fizer nada, não vai dormir bem à noite. No entanto, se houver bastante gente na rua no mesmo momento, todos se tornam responsáveis. Um espera o outro agir. E a obrigação é naturalmente dissipada.

Algo semelhante acontece, por exemplo, num trabalho escolar. Se você fizer um grupo de 3 ou 4 alunos, provavelmente todos terão que trabalhar. Se um não colaborar, a equipe vai ser prejudicada. Mas se o grupo for de dez pessoas, por exemplo, a responsabilidade se dilui. E é grande a chance de dois ou três relaxarem. (Você era um deles no colégio? E na faculdade?)

Nessa mesma linha de aspectos psicológicos e comportamentais, outro problema surge em grandes equipes: o julgamento. Em times menores isso é mais facilmente gerenciado. No grande grupo, a falta de intimidade intimida. E não se tira o melhor de cada pessoa.

Por isso, “duas pizzas” também é uma boa medida para convocar uma reunião. Em uma reunião com 20 ou 30 pessoas, a maioria vai ser telespectadora. Como citado acima, a responsabilidade é diluída, e a participação é reduzida. Ao invés de comunicação, temos ruídos: quem fala mais alto é ouvido. Ou, quem manda fala, e os outros silenciam. Afinal, “ele é o chefe, é responsabilidade dele”.

Concluo insistindo: o nosso modelo hierárquico familiar de gestão destroi a comunicação e a criatividade. Espero que essa geração, que está assumindo empresas familiares, aproveite melhor as pessoas.

quinta-feira, 19 de maio de 2016

O jogo da comunicação

Há alguns dias, dirigindo, eu ouvia no rádio do carro, desinteressado, uma entrevista de um presidente de um clube de futebol capenga. Ele não respondia direito o que perguntavam. Desconversava, falava e não informava nada, enrolava. Ao desligar o carro percebi o quanto eu já acho natural esse tipo de declaração vazia. Estamos acostumados. 

Parece que desde que inventamos as palavras e os idiomas usamos o discurso para enrolar. Ou para tentar explicar ou disfarçar o inexplicável. E, de certa forma, falar bem, para o nosso conceito, é saber sair de perguntas difíceis, esconder o jogo.

É o que percebemos no discurso político, por exemplo. É o que percebemos em treinamentos de vendas e na formação de supostos bons vendedores. É o que se percebe também, curiosamente, na conquista amorosa. Se você for direto e sincero, perdeu.

Ao mesmo tempo, afirmamos que a boa comunicação é uma arte. A mim me parece muito mais um jogo, uma disputa.

E aí entra o dito pelo não dito. O sarcasmo, a ironia (a qual admiro, mas que também faz parte desse jogo). As metáforas que ilustram o intangível e transformam em linguagem o que não nasceu para ser representado – como os sentimentos, por exemplo. 

Mas vamos à parte prática: algumas empresas já perceberam o problema da comunicação. Quem sabe todas já perceberam, mas poucas admitem que é um problema sem solução. Até podemos diminuir ruídos, mas resolver jamais. Ou seja: quanto menos comunicação possível, melhor. E assim nasceram as equipes pequenas da Amazon: times independentes, formados por aproximadamente meia dúzia de pessoas (volto ao tema em breve). É mais fácil se comunicar entre poucos.

Isso significa que nas pequenas empresas, com times pequenos, comunicam-se melhor? Que bom se fosse! Quem poderia ter a comunicação como diferencial em relação aos grandes só piora a estatística, protegidos por hierarquias familiares arcaicas e ineficientes.

Comunicar-se melhor, hoje em dia, talvez seja olhar para as nossas origens primitivas. E falar menos, ou quase nada, ou, se possível, nada. Olhar nos olhos, em silêncio, e interpretar o que acontece, o que passa, o que sente. Como provavelmente se fazia antes de anoitecer e dormir, dentro das cavernas.

quinta-feira, 12 de maio de 2016

Sobre mercados pequenos

Em cidades pequenas nem sempre temos mercado. Explico: nem sempre temos clientes suficientes para comprar nossos produtos. Algo óbvio, fácil de perceber, mas muitas vezes ignorado.

Há alguns dias eu falava com um empresário de uma cidade de aproximadamente 2 mil habitantes. Daquelas que eram uma linha, um distrito, e viraram um município com prefeitura, vereadores e tudo. 

Fiz uma apresentação sobre marketing nessa cidade. Eu falava sobre a importância de segmentar, focar, diferenciar e tal.

Ao final da apresentação, um empresário local me procurou. Ele disse que essa ideia de foco e público-alvo não servia para ele. No pequeno ponto comercial dele funcionavam várias coisas, como um pequeno shopping.

Ou seja: ele queria atrair todas as pessoas da cidade. Por isso não tinha um público definido. Ele queria todo mundo e por isso vendia de tudo. O raciocínio dele faz certo sentido: para que meu negócio funcione, aqui onde estou, eu preciso trazer para dentro da loja todas as pessoas da cidade.

O tamanho do mercado consumidor deveria ser o primeiro fator a ser avaliado pelo empreendedor. E em cidades pequenas isso sempre deverá ser considerado. Mas algo impressionante acontece: o empreendedor não calcula quantas pessoas ou empresas ele terá para atender. Ele é tomado por um otimismo míope, e não considera isso um problema.

Esse empresário local precisa conquistar novos mercados. Viajar, fazer contatos, parcerias. Pensar mais em logística. Usar a internet para se comunicar e vender.
O ponto comercial deve servir de base, e não representar o único local de compra e venda.

Existem muitos bons exemplos: empresas de pequenas cidades entregando produtos em todo o Brasil, algumas no mundo. Prestadores de serviços reconhecidos que atraem clientes e pacientes de toda a região – ou que vão até lá atende-los. Lojas de bairro que se destacam e entregam em qualquer parte da cidade, facilitando a vida dos clientes.

Não é o ponto comercial que define o tamanho do mercado. Precisamos romper essa barreira física que a loja (escritório, consultório) impõe. Mas o que muita gente espera é que os clientes venham, enquanto oferecem chimarrão atrás do balcão. Hoje em dia isso não funciona mais. Temos que desbravar novos mercados.

quinta-feira, 5 de maio de 2016

O desastre e o silêncio

As pessoas me procuram para contar experiências boas e ruins de prestação de serviços. Fico feliz com essa confiança adquirida. E o material costuma ser bom.

Uma pessoa próxima da minha família, que vou chamar aqui de Maria, contou-me uma história bastante interessante. Vou reproduzi-la e depois refletimos. O humor é involuntário. O objetivo do relato é didático. Juro! 

Maria Fictícia está morando há pouco tempo em São Miguel do Oeste. Certo dia  encontrou um salão de beleza para fazer as unhas. Ela não foi até lá por indicação. Foi por proximidade da sua casa, dava para ir à pé. Ou seja: tentou a sorte.

A dona do salão, que obviamente ela nem conhecia, contou quase tudo sobre sua vida. Sobre o que faziam o marido e os filhos. A intimidade imediata me parece fazer parte do processo de atendimento de alguns locais. Mas tudo bem, isso não é grave.

O desastre veio em seguida: a prestadora de serviços, dona do salão, não enxergava direito. E o resultado foi desastroso. A mão de Maria ficou parecendo um trabalho de artes do jardim de infância. Sem saber como reagir, Maria foi embora rápido, de mão fechadas, para ela mesma retirar o esmalte em casa.

Essa história é engraçada? Até certo ponto sim. Mas ela retrata algo comum que passa despercebido: o quanto ignoramos a percepção das pessoas. Isso destrói negócios e carreiras. Nesse exemplo, se essa senhora tiver sorte, alguém vai fazer um escândalo e ela vai descobrir que está ficando cega. Mas somos amáveis. Queremos evitar conflitos. E assim, resignados, não falamos nada. 

E então eu pergunto ao pequeno empresário: como está a satisfação dos seus clientes? E ele responde que está boa. E ele pensa isso porque ninguém está reclamando. E se alguém reclama é tratado como um chato, xarope, ranzinza. Mas essa reclamação é valiosa. E deveria ser incentivada. E o silêncio definitivamente não é um bom sinal, seja na prestação de serviços, seja em um relacionamento profissional (no amoroso também?).

Precisamos saber que, em geral, as pessoas não reclamam. Elas contam para todo mundo, menos para você que vendeu. Elas contam para mim, e eu conto aqui, para você. Mas conto o milagre e não revelo o santo. Afinal de contas, somos amáveis, e preferimos evitar conflitos.