quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

A falta de comprometimento

Na revista Exame da primeira quinzena de janeiro, o renomado consultor Vicente Falconi responde a seguinte pergunta de um leitor: “A empresa em que trabalho está cogitando acabar com o programa de trainees. Uma das razões é que os jovens parecem cada vez menos comprometidos. O que o senhor acha disso?”

Falconi responde assim: “Acho que sua empresa deve estar com um ambiente de trabalho péssimo e não deve ter nenhum sonho futuro. Os jovens provavelmente é que estão certos. As pessoas querem, essencialmente, duas coisas na vida profissional: ter felicidade enquanto realizam o trabalho e sentir que estão construindo algo importante para o mundo em alguma medida. Se sua empresa é incapaz de oferecer essa percepção aos funcionários, então, mais uma vez, os jovens tem razão.”

Falconi lembra ainda que o jovem de hoje não espera muito tempo até mudar de rumo. E segundo o consultor, ele está certo em ser assim. No entanto, empresários e gerentes repetem sempre a mesma coisa: “Falta comprometimento dos novos funcionários!” Mas a pergunta que os empregadores devem responder é a seguinte: vale a pena se comprometer com a sua empresa? E se o jovem se comprometer, ele será correspondido?

Costumo conversar com alguns alunos aflitos, que trabalham em uma empresa em que percebem a bagunça, não são ouvidos e não enxergam perspectiva de mudança. E eles me perguntam o que eu acho que deveriam fazer. A minha sugestão é sempre a mesma: converse francamente com seu chefe sobre isso. E se ainda assim nada for feito, comece a procurar (ou a criar!) outra oportunidade.

Eu concordo que as novas gerações possuem essa característica efêmera: mudam de caminho e opinião com uma facilidade espantosa. No entanto, essa aparente falta de rumo, geralmente, é uma busca por propósito. E poucas empresas conseguem oferecer isso. Em geral, querem funcionários que façam seu trabalho de modo exemplar em troca do salário. Mas só isso não é suficiente, e as empresas precisam mudar.


E para entender o quanto isso mudou, mais um comentário do consultor Falconi: “A função de uma empresa é social. O lucro é a expressão de sua capacidade de realizar sua função social de forma produtiva. Quem não perceber isso, não ficará com os melhores jovens.”

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

A relatividade não passa

Eu não gosto da teoria da relatividade. Eu não gosto de Albert Einstein. 

Eu li em algum lugar que Einstein, certa vez, explicou assim a relatividade do tempo: quando você está numa aula chata, o tempo parece demorar para passar. Quando você está sentado ao lado de alguém que você gosta, o tempo passa voando. Não sei se ele disse isso. Mas de fato o tempo é assim mesmo, relativo.

Dependendo do local e da situação, o tempo passa mais rápido ou mais devagar. Dessa constatação surgem alguns devaneios.

Por que ficar alguns dias sofrendo, quando você sabe que, no futuro, esse sentimento que hoje lhe castiga será esquecido? É, ele será ridicularizado pela indiferença que vem com o tempo.

E por que os bons momentos não acontecem em câmera lenta, como num filme? Poderia ser o contrário: os bons momentos poderiam passar se arrastando, e os momentos ruins... apenas algum instante ingrato. Mas a realidade é outra. Será por causa da relatividade do tempo que ultimamente sua vida está tão triste?

Eu deveria estar falando sobre Marketing e Inovação mas não tenho vontade. É assim mesmo: os assuntos que eu mais gosto ficam distantes quando o tempo está passando devagar.

Eu entendo a teoria e sei que essa semana vai passar em câmera lenta. Mas na semana que vem, no máximo na próxima, eu volto: em busca da semana que passa depressa. A vida feliz, como se sabe, passa voando. Isso não é triste?

Mesmo não gostando de Einstein, escrevi uma frase famosa dele atrás do meu cartão de visitas: “Loucura é fazer sempre a mesma coisa, do mesmo jeito, e esperar por resultados diferentes.” É boa, e tem tudo a ver com o meu trabalho. Gosto de observar a reação das pessoas quando leem a frase.

Mas resolvi pesquisar: é uma frase atribuída. Não há certeza de que Einstein disse isso. Mas alguém disse. Então esse alguém pode ter pensado: “Bom, já que eu não sou ninguém, mas criei uma frase boa, vou afirmar que foi alguém famoso que disse isso.” Esse fenômeno se repete bastante hoje em dia: anônimos escrevem textos cheios de opiniões distorcidas e assinam como Arnaldo Jabor. Ou Luis Fernando Veríssimo. E você propaga a impostura ao compartilhar o texto no Facebook.

Mas fugi do assunto. O que eu queria dizer hoje é que não importa quem falou: o tempo e a loucura são relativos. Vamos compartilhar.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Je suis Charlie

Como boa parte do mundo, fiquei chocado com o massacre ocorrido na redação do Charlie Hebdo em Paris. O fato me atingiu de uma forma peculiar. Explico.

Lá pelo ano 2000 eu desenhava charges e publicava no Jornal Regional daqui de São Miguel do Oeste. Criei um personagem que era colocado em situações locais e fazia algum comentário, ou alguma leve provocação sobre algo que chamasse a atenção.

Um prefeito da região utilizou máquinas da prefeitura em sua própria terra. Eu fiz uma tirinha (dois ou três desenhos em sequência) rimando o nome do prefeito com um modelo de trator. O partido não gostou, mas ficou por isso.

Depois fiz um desenho sobre uma boate famosa na época. As brigas por lá se tornaram frequentes. Desenhei meu personagem indo feliz para a festa mas, na chegada, deparou-se com socos e pontapés. Também desenhei uma latinha sendo arremessada em meio à confusão, e nela escrito “R$ 1,50” – na época, um preço absurdo para a cerveja. Nesse caso a reação foi maior: acusaram o jornal de apoiar uma nova boate que seria inaugurada (mas que nunca foi). Mas não: era só um rapaz inconsequente que adorava lápis e canetas pretas.

A situação mais grave que recordo foi quando mexi com a Polícia Militar. Na época existiu uma “operação” para multar motoristas que não ligassem o pisca ao passar pelas rótulas. Foi chamado de “Dia do Pisca”. Minha mãe foi multada. E eu desenhei um policial aceitando suborno do meu personagem. A reação da polícia foi agressiva, e acabei aceitando um acordo indigesto para evitar problemas maiores: na semana seguinte, tive que desenhar meu personagem preso por tentar subornar um guarda.

Eu sei que não é fácil conviver com a liberdade de expressão. É muito simples erguer uma bandeira e falar que todos tem o direito de se expressar. Mas eu duvido que você, caro leitor, aceita sem problemas tudo que as pessoas falam por aí. Desde as ignorâncias postadas com erros de português no Facebook, até a opinião política e religiosa divergente da sua. 

Nas empresas acontece algo semelhante: o poder da hierarquia impede a opinião e a crítica. E se um funcionário desenhar uma caricatura do chefe, o que pode acontecer? Demissão por justa causa?

Comovido com os atentados, prometi criar outro personagem e voltar a desenhar. Ando diplomático demais. Decidi provocar mais em 2015Eu sou Charlie também.



quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Fogo Amigo

Não é exatamente o tema da minha coluna, mas não há como não falar sobre mais um acidente fatal em função da queima irresponsável de fogos de artifício. Foi aqui perto, em São Carlos. A família soltava os tais foguetes “treme terra” em frente à casa. Um dos artefatos tomou um rumo inesperado e explodiu na varanda, matando uma mulher de 25 anos e deixando duas crianças com graves queimaduras pelo corpo – uma delas, seu filho de 3 anos.

Acabei de ver a reportagem da RBS sobre o ocorrido. Ao final da matéria, um bombeiro explica maneiras seguras de soltar foguetes. Mais uma vez, buscamos respostas certas para perguntas erradas. A pergunta não deveria ser como utilizar esses artefatos de guerra de forma segura. A pergunta deveria ser: é possível permitir a compra desse tipo de material explosivo? Quantos dedos, mãos e vidas ainda serão perdidos de forma tão banal e irresponsável?

É absurdo falar sobre o modo correto de explodir bombas. Temos que falar em redução de poder explosivo, restrição produtiva, rigor no armazenamento, na fiscalização. Mas o mais delicado, no momento, é o que falar para essa criança de 3 anos quando ela deixar o hospital.

Além desse incalculável custo humano de explosões erradas, temos também um custo financeiro enorme na comercialização de fogos. Tudo bem, é uma indústria como qualquer outra, que gera empregos e impostos, mas é uma daquelas coisas inexplicáveis: por que queimar tanto dinheiro com barulhos e luzes? Sei que é algo tradicional e o espetáculo é bonito, mas não poderia ser algo mais... civilizado?

Imaginemos algo assim: todas as pessoas que compraram fogos poderiam, no ano que vem, doar 50% do valor gasto com fogos nesse ano. Com essas doações poderíamos fazer alguma coisa. Por exemplo: uma festa da virada para os nobres haitianos que estão longe de casa. Poderíamos convidar também os índios que perambulam pelas ruas da nossa cidade. Apareceríamos no Jornal Nacional, acredite.

Mas será que temos essa consciência social? Lembro que no final dos anos 90, quando meu pai era promotor de justiça em São Miguel do Oeste, foram apreendidos fogos de artificio armazenados em locais irregulares. Naquele ano, a noite de Ano Novo foi bastante silenciosa, já que boa parte dos fogos não pôde ser vendida. 

Em momentos assim, não tem como não citar Nelson Rodrigues: consciência social de brasileiro é medo da polícia.