quinta-feira, 23 de março de 2017

A necessidade motiva

Em geral, a motivação parece exigir uma necessidade para acontecer. É bem óbvio: você estava há décadas se alimentando de qualquer jeito, e então o médico deu um susto em você. A partir daquela consulta você mudou radicalmente seus hábitos. Ou então você fazia algo que é errado, mas que mesmo assim muita gente faz, e apareceu a polícia e também deu um susto em você. E no mesmo dia você mudou de comportamento.

Lembro de uma situação em que o dono de uma empresa reuniu sua equipe e abriu todos os números para os funcionários. Havia um clima grande de insatisfação. Parece que o chefe ouviu dizer que o comentário era que ele estava ficando rico, enquanto os pobres funcionários eram explorados. E então ele expos os números caóticos, empréstimos, financiamentos, inadimplência. Silêncio. E uma certa motivação surgiu na equipe.

Motivar é dar um motivo para agir diferente. Claro que é obvio, mas esquecemos disso com frequência. Você já deve até ter visto um palestrante dividir a palavra motivação em duas: motivo + ação. Um motivo para a ação, ele disse. E sorriu. E você entendeu o que era, e talvez até chorou com a mensagem bonita (motivacional, ou motivo + emocional?). Mas no outro dia a realidade e a rotina lhe passaram a rasteira, como sempre.

A fórmula do palestrante afirma que precisamos de um motivo. Mas como encontrar esse motivo? No seu trabalho, se você tem um chefe e contas para pagar, vai achar um motivo fácil. Mas e a motivação para mudar de vida, voltar a estudar, dedicar tempo à quem é importante, cuidar da saúde e etc?
A melhor resposta que eu encontrei é: seja um profissional naquilo que você quer fazer. O profissional não pode falar “não tenho tempo”, ou “não estou com vontade”. Ele precisa fazer. O médico desmotivado vai lá e opera mesmo assim. O escritor profissional senta e digita durante quatro horas. A secretária profissional desliga o telefone e sorri quando você chega.

Tratar o que você faz com profissionalismo, acredito, é o melhor caminho para ter motivação. A ação, por si só, gera essa vontade de continuar. Já pensou criar uma rotina diária de ações a respeito do que é essencial na sua vida? E continuar fazendo, até o momento em que dedicar tempo e esforço ao que é importante para você se torne um hábito, uma necessidade.

E assim concluo esse texto, da mesma forma que iniciei: a motivação precisa de uma necessidade para aparecer — e permanecer.

quinta-feira, 16 de março de 2017

Ser profissional antes

Há alguns dias ouvi mais um conselho do Seth Godin: Ele disse que é preciso ser profissional antes de tentar ser bom.

A ideia aqui me parece ser a seguinte: quando você aparecer para vender o que você sabe fazer, você precisa causar uma primeira impressão profissional. Para quem compra, essa percepção pode ser o maior indicador de qualidade. Ainda mais se o cliente não sabe se você é bom.

O mesmo Seth Godin faz um desafio que, um pouquinho adaptado, fica assim: se você pudesse cobrar o dobro do que você cobra pelo que você vende, como você entregaria? Provavelmente você daria um jeito de ser mais profissional. Mas você precisa mesmo cobrar mais para entregar melhor, ou pode se dedicar mais a partir de amanhã?

Tenho um amigo que instala câmeras de segurança. Quando ele visita uma empresa ele chega com um projeto básico impresso — coisa que raramente seus concorrentes fazem. Ele tem um site e uma página no Facebook mostrando seus clientes. Ele explica, antes do problema, o que e como ele vai fazer se tal coisa não funcionar. Pode parecer básico, mas com esse profissionalismo ele já se diferencia dos amadores. Ou você acha que a decisão de compra é apenas uma questão de orçamento mais barato? (Em breve volto a esse tema.)

Mas você já sabe o que é ser profissional. Talvez apenas tenha esquecido o quanto é importante. Escrevo esse texto muito mais em função do perigo que essa ideia pode representar. Porque ela pode ir ao encontro de um mantra que repito, aqui e para mim mesmo, há alguns anos: antes de lançar e inaugurar, é preciso testar. Descobrir. Reduzir riscos. Errar logo para aprender e melhorar o produto antes de formalizar a empresa, por exemplo.

Estou no meio de um projeto que enfrenta esse dilema. Estamos trabalhando com poucos clientes (testando), mas ainda não temos site, marca, CNPJ. Ou seja: não aparentamos tanto profissionalismo assim. Temos que vencer essa primeira impressão no discurso, explicando aos primeiros clientes que estamos validando a ideia de negócio. Não estamos vendendo, estamos convidando para uma parceria de aprendizado mútuo. Nada ainda formal: por enquanto, uma postura de, digamos, profissionalismo informal.

Achar um meio termo no início é um caminho mais seguro para o empreendedor. Ser profissional no comportamento, no processo de descoberta, mas ainda desbravando e descobrindo o que funciona.

sábado, 4 de março de 2017

Fazer sala (comercial)

Um parente próximo resolveu abrir um escritório numa cidade pequena. Ele já fazia trabalhos de assessoria, mas trabalhando mais em casa, ou diretamente na empresa do cliente. Como queria profissionalizar sua atuação, alugou uma sala comercial. Dessa forma ele pôde atrair novos clientes e focar no trabalho de forma mais estruturada, certo?

Outro amigo possui há décadas uma oficina mecânica. Para quem trabalha nesse ramo, o espaço físico em geral representa o início das atividades. E este espaço sempre representou um ponto de encontro de clientes e amigos. Ao longo do dia, especialmente de manhã, a oficina recebe dois tipos de público. Quais seriam? Homens e mulheres? A classe social A e a classe C? Não. Os dois públicos, basicamente, são aqueles que vem para se gabar, e aqueles que vem para se queixar da vida. Todos os dias.

E lá no escritório do meu parente, o que trouxe a nova sala comercial? Na maior parte do tempo, amigos, conhecidos, visitas. Com o objetivo de tomar chimarrão, prosear, fofocar, reclamar, esperar o horário do banco.

No meu trabalho convivo com gerentes comerciais que recebem os clientes em uma sala nos fundos da loja. O que deveria ser relacionamento com clientes, negociação, resolução de problemas, vira facilmente um local reservado ao desabafo e à conversa fiada.

Temos uma noção confusa de o que é trabalhar. Confundimos com frequência o trabalho que precisa ser feito com essa rotina de interações. Ouço iniciantes preocupados em arrumar um local para trabalhar – antes mesmo de ter trabalho, produto, clientes. Cuidado: para garantir um nível mínimo de produtividade, pode ser necessário blindar-se. Para quem está começando, a tal sala comercial nem sempre é uma prioridade.


E para quem realmente precisa de um espaço para trabalhar, precisa também pensar no design da produção e da entrega. Lembro de uma costureira que, há alguns anos, relatou problema semelhante em uma consultoria: ela não conseguia render no trabalho porque apareciam visitas o tempo inteiro. Ela trabalhava na sala de casa: um convite às vizinhas desocupadas. Ela diminuiu o problema dividindo o espaço, colocando a costura em um local separado, sem sofá, cadeira e chimarrão. Não foi preciso tocar as visitas embora: o ambiente molda o comportamento – dos amigos, dos clientes e da própria equipe.