sábado, 4 de março de 2017

Fazer sala (comercial)

Um parente próximo resolveu abrir um escritório numa cidade pequena. Ele já fazia trabalhos de assessoria, mas trabalhando mais em casa, ou diretamente na empresa do cliente. Como queria profissionalizar sua atuação, alugou uma sala comercial. Dessa forma ele pôde atrair novos clientes e focar no trabalho de forma mais estruturada, certo?

Outro amigo possui há décadas uma oficina mecânica. Para quem trabalha nesse ramo, o espaço físico em geral representa o início das atividades. E este espaço sempre representou um ponto de encontro de clientes e amigos. Ao longo do dia, especialmente de manhã, a oficina recebe dois tipos de público. Quais seriam? Homens e mulheres? A classe social A e a classe C? Não. Os dois públicos, basicamente, são aqueles que vem para se gabar, e aqueles que vem para se queixar da vida. Todos os dias.

E lá no escritório do meu parente, o que trouxe a nova sala comercial? Na maior parte do tempo, amigos, conhecidos, visitas. Com o objetivo de tomar chimarrão, prosear, fofocar, reclamar, esperar o horário do banco.

No meu trabalho convivo com gerentes comerciais que recebem os clientes em uma sala nos fundos da loja. O que deveria ser relacionamento com clientes, negociação, resolução de problemas, vira facilmente um local reservado ao desabafo e à conversa fiada.

Temos uma noção confusa de o que é trabalhar. Confundimos com frequência o trabalho que precisa ser feito com essa rotina de interações. Ouço iniciantes preocupados em arrumar um local para trabalhar – antes mesmo de ter trabalho, produto, clientes. Cuidado: para garantir um nível mínimo de produtividade, pode ser necessário blindar-se. Para quem está começando, a tal sala comercial nem sempre é uma prioridade.


E para quem realmente precisa de um espaço para trabalhar, precisa também pensar no design da produção e da entrega. Lembro de uma costureira que, há alguns anos, relatou problema semelhante em uma consultoria: ela não conseguia render no trabalho porque apareciam visitas o tempo inteiro. Ela trabalhava na sala de casa: um convite às vizinhas desocupadas. Ela diminuiu o problema dividindo o espaço, colocando a costura em um local separado, sem sofá, cadeira e chimarrão. Não foi preciso tocar as visitas embora: o ambiente molda o comportamento – dos amigos, dos clientes e da própria equipe.