quinta-feira, 19 de junho de 2014

Miopia em vendas

Na semana passada foi abordada neste espaço a questão da evolução do marketing. Os argumentos utilizados (contra a suposta evolução) foram os seguintes: em geral nossas empresas realizam ações pontuais de divulgação, sem objetivos bem definidos; nossas empresas não conhecem direito seus clientes, e consideram o pagamento o final da relação comercial e, ainda, nossas empresas não sabem utilizar as novas tecnologias, como o Facebook.

Para o texto dessa semana ficou a pergunta: e as vendas, evoluíram?

Theodore Levitt, autor de um artigo clássico chamado “Miopia em Marketing” (o título perfeito) publicado na Harvard Business Review em 1960, afirmava que “a parte de vendas se preocupa com os truques e as técnicas de fazer com que as pessoas troquem seu dinheiro por um produto. Não se preocupa com os valores aos quais diz respeito a troca.” E há mais de meio século, concluía: “O freguês é alguém que está ‘lá adiante’ e que,  mediante um golpe bem dado, pode abrir mão de seu dinheirinho.”

Pense nas suas recentes experiências no varejo e responda, leitor: o cenário mudou em 2014?

Acredito que, se mudou, foi pouca coisa. O maior indicador do atraso é a tentativa desesperada de equilibrar metas agressivas de vendas e bom atendimento. Cada ramo tem suas características, mas em geral é impossível conciliar as necessidades do cliente com a obrigação de vender do vendedor. Vendedores obcecados por metas e remuneração variada não estão preocupados com os problemas dos consumidores. Talvez até estejam, mas isso vem, no máximo, em segundo lugar na sua lista de preocupações.

Sou defensor incondicional do capitalismo, da propriedade privada, do estado democrático e de direito. O livre mercado é o único caminho. Mas é preciso admitir que há algo deslocado nas relações comerciais – algo que destrói qualquer traço de comportamento humano, como a generosidade e a empatia. Consequentemente o comércio é transformado nesse campo de batalha que conhecemos.

Um exemplo disso é que só usamos termos financeiros quando compramos ou vendemos: parcelas, prestações, crédito, débito, juros, financiamento, à vista, à prazo. Estar informado para auxiliar alguém a comprar o que precisa, o que resolve problemas? Não se pensa muito nisso. E a percepção clássica de Theodore Levitt continua atual: em vendas, não evoluímos nada.