quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

Inspiração é para amadores

Não é novidade que sentimentos atrapalham a razão. O caro leitor já deve ter feito uma compra por impulso. Já deve ter ofendido alguém no momento da raiva. Já falou algo que não devia. Só no outro dia, quando a poeira assenta, percebe o tamanho do erro. Como diria algum personagem de Dalton Trevisan, “discussão adiada é meia briga ganha”.

Sabemos que esses sentimentos, digamos, mais latentes (raiva, nervosismo, desejo) confundem a tomada de decisão. No entanto existe uma espécie de sentimento menor que nos atrapalha o tempo todo – e nem percebemos. Esse sentimento é a vontade. Ou melhor: alegamos falta de vontade ou falta de inspiração para deixar de fazer aquilo que precisamos fazer.

Num artigo recente do blog da Harvard Business Review, a autora Heidi Grant Halvorson afirma que ignorar a falta de vontade é uma maneira eficaz de combater a procrastinação. Por que precisamos sentir alguma coisa que nos impulsione a agir?

Lendo esse artigo, uma lembrança da infância apareceu e resultou neste texto. Um amigo, notório repetente, comentou que não entendia como eu tinha vontade de estudar. Lembro que respondi que não tinha vontade: estudava porque não queria reprovar. Era um hábito necessário, uma percepção precoce das consequências dos meus atos. (Se você procurar bastante, vai encontrar uma ou outra lembrança que te enche de orgulho.)

O fato é que nada está te impedindo. Como lembra a autora, nada está amarrando você à cama. A ausência de vontade, se você parar para pensar, é algo que de fato não existe. E para preencher esse vácuo só existe uma solução: criar em você mesmo o hábito de ignorar esse pseudo-sentimento.

No artigo a autora lembra o exemplo de grandes escritores que desenvolveram uma rotina de trabalho. Eles perceberam que se aguardassem pela tal inspiração produziriam muito pouco. Não importa o seu estado de humor: faça o que você quer e precisa fazer, ignorando a falta de vontade. Desanimado e cansado, levanta-te e anda.

Em uma entrevista recente, o fotógrafo americano Chuck Close afirmou que “a inspiração é para amadores. O resto das pessoas simplesmente pega e vai trabalhar”. Detalhe: Chuck Close ficou parcialmente paralisado em 1998 devido a uma compressão da medula espinhal. Mas ele continua trabalhando.