segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

O nosso 11 de setembro

No domingo de meio dia, o sempre agradável almoço de família simplesmente não descia. Notícias desencontradas e a preocupação com duas pessoas queridas que não davam notícia. Minha mãe comparou a tragédia da boate Kiss ao atentado terrorista que derrubou as Torres Gêmeas. “Em que ano foi mesmo?” ela perguntou. Eu respondi de modo arrogante que foi em 2001 e que não tinha nada a ver.

Tem tudo a ver, mãe. Peço desculpas aqui, por escrito. A tragédia de Santa Maria é o nosso 11 de setembro. A única diferença é o perfil dos terroristas.

Nossos terroristas são picaretas, desinformados e negligentes. Eles não têm um livro sagrado – mal sabem ler, refestelados no sofá. Lá longe o que mata é um atentado suicida. Aqui é a displicência, a embriaguez, a gambiarra.

Nossos terroristas, acredite, são mais hereges que os deles. Eles justificam seus crimes alegando que foi uma fatalidade, ou o destino ou, heresia maior, alegam que foi vontade divina. Lá, Deus é o motivo. Aqui, Deus é a desculpa.

Nossos terroristas contam com o apoio velado dos moralistas. Maltratando a língua portuguesa e os que sofrem, questionam nas redes sociais os hábitos e costumes dos envolvidos. Como se Deus abandonasse os seus em função de um comportamento que eles (eles!) julgam inadequado. Se lhes falta misericórdia, que tenham ao menos a decência de um silêncio decoroso. Quantos “curtir” lhe renderam a dor alheia? 

Nossa ameaça é tampouco um movimento separatista. Nossos terroristas não reivindicam nada: são apenas malandros inconsequentes, especialistas no jeitinho brasileiro. Eles são os responsáveis por tornar seu país um local onde se vê de tudo – menos as fatalidades.

Estou há dias procurando uma maneira de terminar este texto. Escrevo e apago – não encontro as palavras. As duas pessoas queridas não deram notícia. Elas foram a devastadora notícia. Palavras, por mais bem escritas, não importam mais.