quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Qual é o seu limite?

No filme “Tudo pelo poder”, Stephen Myers (Ryan Gosling, sempre avassalador) faz as relações públicas da campanha eleitoral do governador Mike Morris (George Clooney). Num certo ponto da trama, o governador está no banco traseiro de um carro, conversando com sua esposa. Ela pergunta o motivo de ele não aceitar uma aliança com certo senador, o que lhe daria grande vantagem. E ele explica que várias vezes já cedeu e passou do limite que ele tinha estabelecido: limites éticos e morais. Aceitar tal aliança seria demais.

Imagine que os seus valores são um terreno cercado. Ali dentro está o seu código de conduta: até que ponto você pode ir para alcançar aquilo que você quer. Teoricamente, mentir, roubar e matar são coisas impensáveis, estão além da cerca, do limite que você estabeleceu.

Mas o poder e a ganância podem fazer você flexibilizar os seus limites. O resultado que você quer exige que você faça algo que você não gostaria que seus pais soubessem. O filme mostra isso: você começa a aceitar pequenas infrações, elas se tornam hábitos e, quando você percebe, desapareceu a tênue linha entre o certo e o errado.

Há muitos anos, em um mercado em Curitiba, vi um senhor devolver uma pequena quantia em dinheiro para o caixa. A quantidade era quase irrelevante, alguns centavos. Mas ele se justificou: “É assim que começa”. Começa o quê?, pensei na época. Hoje creio que ele não arriscava ultrapassar seus limites. Mesmo que só alguns milímetros.

Ser flexível é uma virtude? Nem sempre. Mudar de opinião é uma coisa. Condicionar valores e princípios aos interesses em jogo é outra. O problema é que é do ser humano justificar seus atos de acordo com a consequência, com o resultado obtido.

Um dos lados do seu cérebro está sempre justificando suas atitudes. É mentira que o notório corrupto chora sozinho à noite. Ele mesmo se ilude, releva, encontra culpados. O cérebro inquieto faz esse trabalho sujo enquanto o coração, maricas, permanece calado.

Millôr - Paz da classe média