quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

A semana e toda a vida

Costumo dirigir a palavra escrita aqui aos gerentes, proprietários, chefes. Afinal, as mudanças de maior impacto dependem de quem manda. Mas obviamente existem questões que escapam da responsabilidade deles. A seguir, um exemplo.

É normal encontrarmos no Facebook publicações com dizeres mais ou menos assim: “Até que enfim sexta-feira!”. Ou então: “Graças a Deus acabou a semana!”. Ou ainda: “Não aguento mais, preciso de férias!”

Muitas vezes sentimos a mesma coisa. Curtimos essas frases e imagens que comemoram o final de mais uma semana de trabalho. No entanto, é preciso ter certo cuidado ao tornar públicas essas manifestações. Elas revelam um pouco sobre o seu trabalho – e muito sobre você.

Se o seu chefe lê uma frase dessas que você postou, o que ele pensa? A primeira impressão é que você não gosta muito de trabalhar lá. Que o que você faz é um sacrifício e você não vê a hora de acabar. E que é bem provável que na primeira oportunidade você vai abandonar o barco. Ou estou exagerando?

Mas digamos que você esteja realmente cansado do seu trabalho, e não liga em demonstrar isso, mesmo que indiretamente, para quem quiser saber. Será que essas expressões não podem prejudicar o futuro? Imagine alguém que pensa em contratar você, mas no histórico do Facebook vê que você costuma comemorar a sexta-feira e reclamar da segunda. Será que simplesmente mudando de trabalho você vai começar a gostar do que faz?

Mais um sinal: o tempo costuma se arrastar quando fazemos o que não gostamos. E os bons momentos passam voando. Isso não acontece apenas nas férias – é assim em qualquer lugar. Logo, se você reclama que ainda é segunda ou terça, podemos inferir que você não está se divertindo das 8 às 18.

Além da percepção que causa nos outros, ficar reclamando que a semana de trabalho não passa é um problema pessoal, que precisa ser encarado. A principal reflexão é: será que você vai passar a vida esperando pelo final de semana? Será que o trabalho precisa ser esse fardo? Será que, ao invés de reclamar, não seria melhor construir outro caminho?

Cada final de semana que se comemora representa um pedacinho do ano que vai embora. Quem comemora toda semana que termina, já pode comemorar o ano que acaba – mas que, profissionalmente, foi jogado fora. Feliz Natal!



quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Sobram planos, falta tempo

Quem acompanha o meu trabalho sabe que, com certa frequência, faço apresentações sobre Marketing e Inovação pela região. Ao final das apresentações, sempre deixo meu e-mail e falo que, quem quiser a apresentação em PDF, basta me escrever. Vejo as pessoas baixando a cabeça e anotando o endereço eletrônico (era assim que se falava em 1999).

No começo eu ficava imaginando a quantidade de e-mails na minha caixa de entrada no dia seguinte. Mas hoje eu sei que vem pouca coisa. Meia dúzia de e-mails no máximo.

Ao final das apresentações muita gente fala comigo. Comentam algo que acontece com sua empresa, algo que se identificaram, e eu peço para me escreverem: “tenho material, vamos trocar informações, vamos ver como o Sebrae pode ajudar”, entre outras exclamações. As pessoas aparentam estar empolgadas, cheias de ideias. Mas logo me esquecem, e não me escrevem jamais.

Sei que não é algo pessoal. O que acontece é a manifestação de uma característica que todos temos: somos todos extremamente criativos. Todos. Temos muitas ideias e planos. Mas sonhar e imaginar é a parte fácil. A parte difícil, que exige certo tempo e dedicação, essa deixamos para depois. E para mais depois. E aquela grande ideia acaba esquecida.

Para evitar isso, sugiro dar o primeiro passo. O primeiro e-mail. A primeira ação tangível. Porque é frustrante ter muitas ideias e nunca coloca-las em prática. E pior, sempre repetindo a mesma desculpa: a falta de tempo. E perceba, leitor: eu não pedi que comprassem selos, fossem ao correio e me enviassem uma correspondência, como se fazia em 1993. É um e-mail, digitado em um minuto. Até que ponto a tecnologia realmente nos ajuda?

Esse primeiro pequeno passo costuma gerar um efeito transformador. Comece a leitura. Mande uma mensagem para um contato importante. Faça a matrícula. Todo grande empreendimento, pessoal ou profissional, começa sempre com uma ação minúscula. No entanto, os mesmos planos grandiosos, quando não é dado esse primeiro passo, morrem no travesseiro, no chuveiro. Morrem na ausência de uma pequena ação inicial.

Falta tempo, mas o tempo vai passar de qualquer jeito. Seria melhor que ele passasse enquanto fazemos alguma coisa. Qualquer ação que represente um começo.


quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Volte a brincar, empresário

Quando penso nos dilemas do empreendedorismo, lembro de algo que acontecia na infância. Construíamos, por exemplo, uma estradinha na terra. Depois a ponte, o rio, a cidade toda. Até que, horas depois, estava tudo pronto: era chegado o momento de brincar. Mas daí a “graça” se perdia. O verdadeiro entretenimento era criar, construir.

Daí escuto que muitos empreendedores não são bons empresários. Segundo os críticos eles montam um negócio mas não sabem administrar. E daí a empresa não funciona.

Pode ser. Mas o que me parece é que continua acontecendo o mesmo que acontecia na infância. A parte divertida é construir. E na empresa estabelecida, quando não há para onde crescer, a equipe perde a motivação e não quer mais “brincar”.

Ultimamente, no entanto, minha preocupação é com aqueles empreendedores que se transformaram em bons empresários. Eles são, do ponto de vista tradicional, bem sucedidos. Abrem e fecham a empresa todos os dias. Controlam toda a gestão, fiscalizam tudo. Condenaram-se, no bom e no mau sentido, a atuar no operacional até o filho assumir. Ou o genro.

É claro que empresas novas precisam da atuação direta do dono. A prática evidencia isso. E quem já estudou o ciclo de vida das organizações vai lembrar: autores comparam um novo negócio a uma criança. Ela precisa da orientação constante dos pais. Mas depois ela cresce. Ou melhor: ela só cresce de verdade se ganhar independência.

Precisamos desses empresários construindo de novo. Por isso, pensei em um desafio. Empresário: defina um período de um ou dois anos, e nesse tempo transfira a gestão do negócio para alguém. Pode ser para um parente, mas o ideal seria que fosse para um funcionário exemplar. Ele merece essa chance. Dizem que os bons carregam consigo a ambição de crescer. E você, empresário calejado? Perdeu essa ambição pelo caminho?

E durante esse processo de delegar a gestão, sugiro que construa algo novo: monte outros negócios. Resolva outros problemas. Abra uma filial. Ou melhor: invista em alguém. Apoie uma ideia de negócio e, além de investidor, seja um mentor. Ajude nossos novos empreendedores. Você sabe como. Você já desbravou o caminho.


quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Repetições preguiçosas

Há alguns dias eu ouvia uma pesquisadora comentar o desafio constante de fazer ciência e não emitir opiniões pessoais. O drama é o seguinte: existem coisas que ela acredita, que ela acha que são verdade, mas que não passaram pelo rigor da observação do método científico. Logo, ela se esforça para evitar esses juízos de valor, pois não se sabe de onde surgiram.

Todo profissional passa por esse desafio. No meu caso, especialmente no marketing, o desafio é não repetir o que todo mundo fala sem analisar a realidade, sem ao menos usar um pouco a lógica ou o bom senso. Vou citar alguns exemplos notórios de frases que repetimos mas que, em geral, representam apenas um discurso preguiçoso.

Primeiro exemplo: “Propaganda é a alma do negócio”. Se o seu negócio não tem uma alma, uma razão de existir, não é a propaganda que vai resolver esse problema. A propaganda existe para mostrar quem você é, como você resolve, o que você tem para ajudar. Caso contrário, estará apenas embalando o vazio.

Segundo exemplo: “Nosso objetivo é atender todas as necessidades dos clientes.” Será que você realmente sabe o que o seu cliente precisa? Será que você é obcecado pelo problema do seu cliente, ou a equipe de vendas só pensa na meta financeira? Há alguns dias, ouvi um empresário se queixar que as pessoas não davam valor ao seu produto. Uma frase que revela o quanto ele está focado em faturar, e não em entregar uma solução.

E para concluir, o exemplo mais corriqueiro: “Aqui o cliente vem em primeiro lugar.” Mais uma dessas frases que todo mundo repete e que ninguém acredita. Sugiro você anunciar que na sua empresa o cliente vem em segundo lugar, e a equipe em primeiro. Assim, quem sabe a equipe assuma como prioridade resolver problemas do cliente, e não se comportar de um jeito quando o chefe está olhando e de outro quando ninguém está vendo. E acredito que os consumidores iriam gostar da ideia. No mínimo iriam prestar atenção em um posicionamento diferente.


A questão não é nem fazer ciência. O desafio, resumindo, é parar de repetir as mesmas mentiras e pensar em fazer as coisas de um modo mais autêntico. E, quem sabe, de um modo mais honesto.

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Interpretando o silêncio

Quem recebe ordens interpreta o tom de voz e o silêncio do chefe das mais variadas formas.

Estudos indicam que quem possui mais poder costuma ter um tom de voz mais firme e estável, e com certa frequência até mais alto. Quem detém o poder também costuma ser mais direto, especialmente por não precisar se explicar muito para convencer alguém.

Por isso, uma palavra inocente ou impensada do chefe pode gerar consequências inesperadas.

Por exemplo, se o seu chefe disser “Preciso falar com você”, e mais nada, você vai começar a pensar em muitas coisas. O que ele quis dizer com isso? O que eu fiz de errado? Quando, provavelmente, o chefe só precisa falar com você.

Uma comparação: você não ficaria tão preocupado se um colega de trabalho dissesse a mesma frase. Talvez você nem prestaria atenção, dependendo do momento. Quando quem fala é quem manda, a imaginação parece funcionar melhor.

O silêncio também é um instrumento poderoso de quem manda. Como o seguinte caso, relatado por um estudioso do assunto: um voo enfrentou, durante alguns minutos, uma forte turbulência, e durante e logo após o ocorrido ninguém da tripulação falou nada. O que estava acontecendo? Você pode imaginar a angústia dos passageiros. 

Em empresas isso acontece com frequência. Um exemplo corriqueiro: em geral, os proprietários preferem não falar com a equipe sobre questões financeiras. Então se especula o quanto a empresa ganha e o quanto o proletariado é explorado. Ou pior: o que não se fofoca quando a empresa passa por turbulências e o chefe não fala nada? A falta de comunicação é um problema de gestão, e que envolve um importante detalhe: o silêncio do chefe é a mais misteriosa das mensagens. 

Por isso sugere-se, especialmente para os chefes, muita atenção à comunicação, pois certamente vai influenciar o comportamento da equipe. E nenhuma equipe tem bom desempenho em meio a silêncios, boatos e mal-entendidos.

E se o chefe não for bom em comunicação? Nesses casos, provavelmente ele também não é um bom chefe. Ou ele resolve mudar e se comunicar melhor, ou precisa atuar em alguma área técnica da empresa, que não exija coordenação, liderança e trabalho em equipe.

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Adaptado e piorado

Não vou citar nomes, mas conheço algumas pessoas que, em qualquer negociação, choram por um desconto no preço. O leitor também deve conhecer alguém assim. Quem sabe essa personagem aparece no espelho do banheiro.

Não é um defeito. É um direito pechinchar. Mas vou usar um exemplo bem prático do quanto essa barganha pode ser prejudicial para uma empresa, especialmente para o prestador de serviços.

Uma dessas pessoas que eu conheço, quando faz cotação de seguros, por exemplo, pede para o corretor cortar o máximo de coberturas para chegar no menor preço. Se o corretor fizer isso, acaba deixando de fora coberturas que ele sabe que são importantes.

Se o cliente não acionar o seguro, não vai fazer diferença. Mas se o cliente tiver que usar o seguro, vai sentir falta de benefícios esperados, porém inexistentes. O corretor pode até alegar: “Foi você que quis o seguro assim, mais simples e mais barato.” Mas no momento de estresse não muda nada dizer “Eu avisei!” para o cliente.

O que se sabe é que o corretor vai se incomodar. O cliente vai precisar de apoio, mas os cortes feitos para fechar o negócio poderão prejudicar a sua experiência. Mesmo tendo sido opção dele uma cobertura básica, quem também vai se incomodar é o corretor.

Isso acontece com vários prestadores de serviço, e até com produtos, que fazem cortes na qualidade para conseguir vender. Ou então mudam e adaptam sua especialidade para poder alcançar mais pessoas. A pergunta é: e se algo der errado, vai valer a pena o incômodo?

Podemos usar um exemplo mais crítico: imagine um dentista que resolve qualquer problema, inclusive aqueles que não são sua especialidade. Ele faz diversos procedimentos, digamos, porque está começando, ou porque precisa de mais clientes. Será que esse é o caminho para o sucesso profissional? Ser um generalista?

Em momentos de crise, como o atual, é comum empresas ampliando sua atuação para conquistar mais clientes. Isso nem sempre é um erro: no entanto, a empresa (ou o prestador de serviços) precisa manter suas características, sua essência. 

Tentar vender de tudo para todo mundo é perigoso. Assim como é arriscado ser o prestador de serviços que atua em várias áreas porque precisa pagar as contas. É mais eficiente e menos desgastante encontrar o problema que precisa da sua especialidade, da sua solução.

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Sobre postagens frequentes

Com certa frequência, sou perguntado sobre a quantidade correta de postagens que uma empresa deve fazer no Facebook. Todo dia? Quantas vezes por dia? Ou quantas vezes por semana? Não sei a resposta. Não existe uma regra. Portanto, o que resta é testar e usar o bom senso.

Guy Kawasaki, talvez o maior especialista no assunto, afirma que não existe um número certo ou um limite. Para ele, a única regra é que o conteúdo que você postar deve ser bom, útil, relevante. E muito importante: conteúdo bom, útil e relevante para o seu público, e não apenas para a sua empresa. Caso contrário, você vai divulgar apenas coisas sobre o que você quer vender. Ou gabar-se sobre o que você faz – ou “selfies empresariais”. Esse não é o caminho. Conteúdo bom é aquele que orienta, ensina, ajuda as pessoas – e mostra que você é especialista no que faz.

Guy Kawasaki afirma que se o seu conteúdo for bom você pode postar 10 ou 20 vezes ao dia. Mas eu tenho certeza que você não tem tanto conteúdo bom para postar. Por isso, se você exagerar, vai começar a irritar as pessoas. E em pouco tempo elas não vão mais prestar atenção no que você divulga.

A atual quantidade de conteúdo irrelevante incomoda as pessoas – e também preocupa o Facebook. A rede social já possui mais de 1,5 bilhão de usuários. E é todo mundo – inclusive você e eu – querendo aparecer. Logo, o Facebook precisa mediar esse conteúdo. Eles ganham dinheiro quando páginas impulsionam postagens. No entanto, por outro lado, eles precisam garantir que a experiência do usuário continue agradável. Ou então o usuário, entediado, vai embora. E os anúncios também.

Por isso, uma sugestão para as pequenas empresas que desejam postar com frequência no Facebook: crie temas diários para compartilhar. Por exemplo: se você tem uma loja, na segunda-feira poste algo sobre tendências. Na terça, uma promoção. Na quarta, tire uma dúvida frequente dos clientes. E assim por diante. Encontre temas relevantes para não ser repetitivo e não postar sempre as mesmas coisas.

A melhor regra, vale insistir, é o bom senso. E como filtro, refletir antes de postar: o conteúdo informa e orienta, ou é apenas vaidade?

quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Estereotiparam você também

Há alguns dias, ao chegar em Florianópolis, conversei um pouco com o taxista. Ele desabafou: o dia de trabalho estava difícil. Ele disse que havia se envolvido num acidente pela manhã. Enquanto ele falava sobre a confusão, algo me chamou a atenção. A pessoa do outro carro envolvido no acidente teria dito algo assim: “todo taxista é folgado!” 

E ele me disse que sofre no dia-a-dia com essa generalização. Desde passageiros achando que ele vai dar um jeito de cobrar mais, até outros motoristas preocupados com sua atitude no trânsito.

Isso acontece com quase todas as profissões: forma-se um estereótipo do profissional, e ele vai ter que lidar com isso na rotina de trabalho. Não importa se a pessoa é um motoboy em cidade grande ou se é um político em Brasília.

Vou aproveitar o tema para falar sobre um estereótipo que conheço bem: o de vendedor. Quem nunca ouviu a frase “ele sabe vender!” Em geral é usada para se referir ao vendedor que é quase um mágico – ele tem truques para persuadir o cliente. A propósito, se você procurar no Google, verá que existem inúmeros mágicos ensinando vendas.

Por isso, quando as empresas contratam vendedores, já procuram pessoas com esse perfil falador e desinibido. E aí começa o problema: os clientes conhecem bem esse perfil de vendedor. E hoje em dia, com as facilidades de tecnologia e entrega, muitas pessoas evitam as lojas porque sabem que é difícil argumentar com esses faladores. Mas a preocupação do gerente é com os números, não com a experiência de compra. O ponto de vista do consumidor é ignorado. Por isso, continuam contratando pessoas com esse estereótipo defasado de vendedor.

Eu imagino uma equipe de vendas diferente. Que ouça bem mais do que fala. Que pergunta mais do que responde. Que apresente um certo desapego da obrigação de venda. Com foco total no problema, na situação do cliente, e na melhor maneira de resolvê-la – pois sabe que isso é o que gera a transação financeira. Algo precisa ser feito para mudar aos poucos esse estereótipo do vendedor chato. Não é uma mágica que vai resolver.

Para concluir, uma pergunta ao nobre leitor: você sabe o que as pessoas falam sobre a sua profissão? Conhecer essa percepção pode ser a melhor maneira de se diferenciar.

quinta-feira, 22 de outubro de 2015

É bom ou você acha que é bom?

Há alguns dias, o ator Antônio Fagundes fez a seguinte declaração no programa Roda Viva, da TV Cultura: “Se 30 mil pessoas pagam 750 reais para ver um cara bater no outro, o teatro é barato demais”. O ator se referia às lutas de MMA, o sucesso que conhecemos e que repercute em todo o mundo. E a comparação aconteceu porque o ator respondia a uma questão sobre o preço das entradas de peças de teatro, que por serem caras, afastariam o público.

Num primeiro momento, a vontade é de concordar com a comparação de Antônio Fagundes. E percebe-se que, indiretamente, ele quis dizer que o teatro vale mais do que a luta, especialmente se observados por uma escala de valores culturais.

Do ponto de vista cultural e artístico, Antônio Fagundes pode até ter razão. Mas do ponto de vista comercial, sua declaração é, no mínimo, ingênua.

Em primeiro lugar, nem toda peça de teatro é boa. Arrisco dizer que uma minoria vale a pena. Dessa forma, sair defendendo todas as peças de teatro é apenas corporativismo. O ator acredita que o que ele faz é mais nobre que outras atividades, e que o povo tem o dever de prestigiar, e não reclamar do preço. Mais ou menos como o empreendedor que acredita que o seu produto ou serviço é superior. E que o povo é que não entende. Antônio Fagundes acredita que falta cultura. Empreendedores acreditam que falta o quê? Propaganda?

Em segundo lugar, se você entra na questão de preço e venda, você saiu do campo artístico e está falando de negócios. Quem quer vender precisa entender que o que produz é para as pessoas, e não para materializar uma inspiração artística. Logo, é preciso fazer algo que as pessoas queiram porque é bom, não porque o iluminado acha que elas deveriam comprar. Uma inspiração artística, por melhor que o autor/ator ou a crítica acreditem que seja, não é garantia de sucesso comercial – por mais que eles afirmem (insisto!) que o povo tem a obrigação de prestigiar.

Creio que a salvação do teatro não está no preço ou na consciência cultural do público – está na qualidade das peças e dos atores. E a salvação dos negócios está na qualidade dos produtos, dos processos e das pessoas – e não na inspiração do empreendedor.



quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Inauguração vazia

Os empreendedores costumam supervalorizar o lançamento de seus negócios. Eles imaginam uma grande inauguração. Imaginam que vai ser o assunto da cidade. Gostariam que a imprensa cobrisse o fato. Mas não é mais assim que funciona.

Eu entendo o sentimento: empreender é difícil. E é motivo de orgulho para quem o faz. Mas existe um problema: em geral, as pessoas não ligam para o seu esforço. Em geral, as pessoas não ligam para a sua empresa. Você vai ter que falar, mostrar e provar que o que você faz é importante e relevante – para as pessoas. Para você, empreendedor, eu já sei que é importante. Mas eu, como consumidor: por que eu vou ir até a sua empresa, gastar meu tempo, ouvir a sua equipe e ainda gastar dinheiro? Preciso de um bom motivo.

Outro problema: os empreendedores querem que tudo esteja perfeito para a inauguração. Investem em decoração, placas, iluminação, fachada, móveis, a estrutura completa. Mas o perfeito não existe. É melhor lançar algo bom, ou até razoável, e construir o resto aos poucos. Em negócios, o perfeito costuma ser inimigo do bom.

Questiono com certa frequência, neste espaço, aquela ideia arcaica sobre empreender: muita gente ainda acredita que o primeiro passo é ter um bom ponto comercial. E então descobrir o que “dá dinheiro”, ou o que “ainda não tem” na cidade.

E então, depois de tudo, ou quase tudo do jeito que ele queria, abre as portas e espera as pessoas entrarem. A parte mais difícil costuma ser conquistar clientes: mas ela é considerada uma consequência do capricho inicial. Não é mais assim que funciona.

O ideal seria que o empreendedor fosse lançando sua ideia aos poucos.
Quem sabe já ir criando confiança antes da grande inauguração. Criando protótipos, amostras, testando produtos. Colhendo o precioso feedback dos clientes. É como o treino antes do jogo.

A inauguração pode ser comemorada. É interessante chamar a atenção, criar certa expectativa, gerar novidade. Mas isso precisa ocorrer na cabeça dos consumidores, e não na cabeça do empreendedor – ele precisa ter começado bem antes. Se não for por uma questão de estratégia de negócio, que seja para evitar um grande investimento inicial em algo incerto.

E que a inauguração seja muito mais um momento que marque a certeza – e não o primeiro passo rumo ao desconhecido.


quinta-feira, 8 de outubro de 2015

Privações tecnológicas

Uma reportagem do Jornal Nacional mostrou o preocupante cenário do roubo de celulares no Brasil. Aproximadamente 3 mil celulares são bloqueados por dia no País – o proprietário pede o bloqueio para que ele não seja usado pelo bandido. Alguns, resignados e já cansados de tanta falcatrua em todas as partes, nem bloqueiam o aparelho perdido. Ou seja: é bem provável que o número de aparelhos roubados seja ainda maior. No máximo agimos como o Chaves, que foi à igreja rezar para que o ladrão (o Senhor Furtado) se arrependesse e devolvesse o ferro de passar da Bruxa do 71.

No passado recente, o medo era ter a carteira roubada. Esse tipo de ladrão sempre foi chamado de batedor de carteira. E o ladrão de celulares, já tem um apelido?

Minha irmã mora em Florianópolis e prefere não ter um celular muito bom. O medo de perder o investimento existe, mas é secundário. O medo maior é despertar a atenção dos ladrões. É passar pelo trauma de um assalto.

Perceba o dilema, caro leitor: não se pode usufruir totalmente de um benefício da tecnologia – ele precisa ser utilizado com cautela, já que a segurança pública não nos permite comprar, pagar e usar um celular aonde e quando a gente quiser.

Talvez em cidades pequenas o sumiço de smartphones não seja um problema tão grave. Mas vamos para uma tecnologia ainda mais cara, e que nos preocupa ainda mais: os automóveis. Também temos medo de usá-los. E nesse caso, o medo maior por aqui nem é o roubo: são as estradas destruídas. E nessa conta também entram os estacionamentos lotados e os congestionamentos.

E assim, em qualquer lugar, as necessidades de ir e vir e de se comunicar são impedidas. Reflexos da corrupção, da burocracia, da incompetência: sem infraestrutura e segurança, a tecnologia não anda.


E uma reflexão: será que a tecnologia traria boas soluções para sua empresa? Eu acredito que sim – especialmente na questão da comunicação. No entanto, se assim como o Brasil, a sua empresa também é burocrática e incompetente, a tecnologia não será aproveitada em todo o seu potencial. E em alguns casos pode até representar um retrocesso – desde um sistema complexo implantado para alguém que mal anotava no caderno, até o Facebook para quem não sabe escrever nem se comportar direito.