segunda-feira, 25 de julho de 2011

O bom vendedor e a boa venda

Sou constantemente questionado sobre como vender mais, ou o que fazer para ser um bom vendedor. Um exemplo: há alguns dias, estive numa empresa, prestadora de serviços, que cobrava de seus funcionários a venda de, pelo menos, um determinado produto por dia. Se o funcionário não vendesse, tinha o valor do produto descontado do seu benefício. Os funcionários, obviamente, estavam insatisfeitos com a meta. Mas também ouvi queixas da proprietária: para ela, seus funcionários não sabiam vender. Ela buscava treinamento, inspiração, qualquer coisa para transformá-los em vendedores “melhores”.


Contextualizando: essa empresa está localizada numa cidade pequena de região litorânea. Nos 3 ou 4 meses quentes do ano, o movimento de clientes quadruplica. No restante do ano, o movimento é bem menor, previsível e constante.


Nos meses quentes é até compreensível que a empresa seja orientada para vendas, já que aquele cliente é, ou pelo menos a grande maioria, sazonal (já pensou, leitor, se, numa empresa, prestadora de serviços, que estipula metas de vendas diárias, eu propusesse que cativassem o turista?). Mas obrigatoriamente, no restante do ano, é fundamental conquistar os nativos. É preciso criar um relacionamento de longo prazo. Esses mesmos nativos, além de sustentarem a empresa nos meses frios, recomendarão a empresa aos turistas na temporada, já que eles atendem os mesmos clientes em hotéis, bares, restaurantes, cabarés, etc.


Os funcionários não possuem alternativa: precisam bater a meta diária de um frasco do tal produto. Com isso, praticam uma divulgação desesperada, sem procurar saber se o cliente realmente precisa daquilo. Ele pode até comprar, mas provavelmente não fará questão de retornar. Não sei se o leitor concorda, mas ele pensará algo assim: “Lá não gosto de ir. Os vendedores são muito chatos.” E, o mais grave, vai replicar essa idéia entre parentes, amigos e, claro, turistas.


Percebemos assim que a política de vendas de uma empresa é algo que precisa fazer parte do planejamento estratégico, dos objetivos da organização. E no caso acima descrito, encontramos um paradoxo: quanto “melhor” for o vendedor, mais a empresa perderá clientes. Porque aquele que a proprietária considera bom vendedor, é o mesmo que ignora necessidades e faz com que o cliente compre por insistência. Ele traz um lucro diário próximo da insignificância enquanto repele o tangível mais valioso que um prestador de serviços pode ter: seu cliente fiel.


Sugeri que a meta fosse extinta, ou, vá lá, que seja mantida apenas no verão. Mas acredito que não fui ouvido. Para o consultor, enfim, não há dilemas e não existe paradoxo: o problema dessa empresa não está nos vendedores, mas na maneira de vender. 




*Texto publicado na Vitrine Empresarial de Julho/Agosto 2011.