terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Feliz 2014 – ou nem tanto

Caro amigo,

Sei que não são interessantes essas mensagens padronizadas que enviamos (tudo bem, que EU envio) para todo mundo no Natal ou Ano-Novo. Culpa da tecnologia. Estou recebendo algumas, por exemplo, pelo celular. Hoje cedo o Banco do Brasil lembrou de mim. Ontem alguém que eu não sei quem é. Sou do tempo em que uma mensagem no celular era uma ocasião: aquela expectativa de que alguém especial lembrou de você. A banalização do conteúdo é um efeito colateral da tecnologia.

Eis então uma mensagem nova no seu Facebook, de alguém que provavelmente não é especial. Sinto muito. Mas de uma nova forma, a tecnologia também aproxima: não fosse o Facebook, é provável que eu não lembraria de você hoje. E você muito menos de mim. A tecnologia vai nos manter próximos em 2014 – mesmo sem ver, mesmo sem falar nada.

*

Além da tecnologia, outro detalhe me encanta e incomoda ao mesmo tempo no final de ano: aqueles planos que fazemos para o ano que vai começar (sempre escrevo sobre esse assunto no final do ano). Acreditamos que o eu do futuro será melhor, mais determinado, mais FELIZ (sublinhe essa palavra, amigo leitor) que o eu do presente. Criamos expectativas sobre nós mesmos! E não se tornar esse super-homem invariavelmente vai ser, ano após ano, frustrante.

Sou fã de um cara que escreve na Folha de São Paulo, o filósofo Luiz Felipe Pondé (compre, se possível, os livros “Contra um mundo melhor” e “Guia politicamente incorreto da filosofia”). Há alguns dias ele falava da contemporânea e avassaladora “mania de felicidade”. Engolimos tarjas-pretas e compartilhamos ensinamentos de autoajuda: vivemos a obrigação de uma vida feliz. Não ser feliz, hoje em dia, é considerada uma questão de incompetência: você que não estaria se esforçando o bastante. No entanto, lembra Pondé, a vida é precária. Caminhamos rente ao abismo, ou rumo a ele. Nosso destino, até onde se sabe, é trágico. Franz Kafka também dizia que esperança existe, mas não para nós.

Dessa forma, dizer que o seu objetivo é ser feliz é não saber aonde ir. É andar no escuro, apalpando paredes em busca de um interruptor que nunca existiu. Se a felicidade é subjetiva e baseada em realizações efêmeras, como então estabelece-la como meta de longo prazo? Se você quer ter metas, precisar definir coisas tangíveis e mensuráveis e então adotar métricas: seria uma quantia em dinheiro? Quantos quilos? Ou: com qual régua você está tentando medir felicidade?

Espero e sugiro que em 2014 você esqueça essa obrigação obsessiva de ser feliz (ou, mais melancólico ainda, “parecer feliz”), por mais nobre que o propósito seja. Essa subjetividade dos desejos e planos é contraproducente e vai resultar, invariavelmente, em frustração.

Resumindo essa mensagem de ano novo: ser feliz é um meio, não um fim. Prova disso, para encerrar 2013 e este texto, o poema “Renúncia”, de Manuel Bandeira:

Chora de manso e no íntimo... Procura
Curtir sem queixa o mal que te crucia:
O mundo é sem piedade e até riria
Da tua inconsolável amargura.

Só a dor enobrece e é grande e é pura.
Aprende a amá-la que a amarás um dia.
Então ela será tua alegria,
E será, ela só, tua ventura.

A vida é vã como a sombra que passa.
Sofre sereno e de alma sobranceira,
Sem um grito sequer, tua desgraça.

Encerra em ti tua tristeza inteira.
E pede humildemente a Deus que a faça
Tua doce e constante companheira.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

O Jeca Tatu moderno

Nelson Rodrigues inventou a expressão “complexo de vira-lata” para descrever o sentimento e, especialmente, o comportamento do brasileiro. Era a Copa de 1950 e o Brasil havia sido derrotado pela seleção uruguaia na final, em pleno estádio Maracanã. Na ocasião, Nelson Rodrigues escreveu que “o brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a auto-estima.” No futebol o Brasil superou o sentimento de inferioridade. Mas ele subiu as arquibancadas e se espalhou, do Oiapoque ao Chuí.

Nossos escritores do Romantismo Indianista, como José de Alencar, O Chato, decidiram inventar um herói nacional no século XIX: idealizaram um índio esbelto e sensível. Mas uns 30 e poucos anos antes da Copa de 1950, Monteiro Lobato descreveu um merecido anti-heroi para a nação: Jeca Tatu. O criador do Sítio do Pica-pau Amarelo resolveu detalhar o caipira brasileiro (não vou citar o termo originalmente usado pelo autor para fugir da patrulha politicamente correta) como um “parasita da terra” e “inadaptável à civilização”. Monteiro Lobato teve a ousadia de culpar o caipira pela sua própria miséria, quando deveria, segundo a opinião pública da época, culpar a herança maldita dos portugueses e o descaso do novo governo republicano. O escritor, achincalhado pela crítica, desculpou-se pelo desabafo – mas o estrago, num bom e esclarecedor sentido, estava feito.

Eis a consequência do complexo de vira-latas: a suposta superioridade alheia é a desculpa para as derrotas. Estamos acostumados a justificar nossos fracassos culpando alguém. Monteiro Lobato ouvia que o Brasil era pobre porque foi explorado pelos portugueses. Nós crescemos ouvindo a mesma coisa, só mudou o algoz: os Estados Unidos. Uma justificativa confortável para o subdesenvolvido.

Nas empresas o sentimento é semelhante. O empresário não vai bem por culpa do funcionário, do governo, do cliente. O funcionário não vai bem por culpa do chefe, dos colegas, das oportunidades que alguém deveria ter lhe oferecido mas que foram negadas. Ou foi ele que esqueceu de pedir?


Eis o Jeca Tatu moderno com complexo de vira-lata: “uma vida inteira que podia ter sido e não foi”. E ele tem certeza que a culpa não foi dele.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Palavras de vago sentido

O Dicionário Oxford, o mais completo da língua inglesa, elegeu a palavra “selfie” como a palavra do ano. O termo significa aquele autorretrato tirado com o celular e invariavelmente publicado em redes sociais. A pessoa estica o braço e aponta a câmera para si mesma. Ou então vai até o banheiro e tira a foto do espelho.

Já utilizei este espaço para falar sobre como o fim do filme fotográfico banalizou a fotografia. Um retrato era uma ocasião. As pessoas faziam pose (e então nasceu o verbo – não confundir com “pousar”) para sair bem na foto, e aguardavam a surpresa da imagem na revelação do filme. Por mim, tudo a favor da tecnologia, a não ser a quantidade de fotografias que mostram tudo e não destacam quase nada.

Palavras nascem enquanto outras perdem o sentido. Um exemplo recente: o termo “inovação”. Na área de negócios é um daqueles clichês obrigatórios. Nas reuniões das empresas é colocado como objetivo. Em sala de aula virou um dos termos usados em qualquer expressão: um atendimento inovador, uma venda inovadora, uma vitrine inovadora no Natal. Virou sinônimo de bom, diferente, melhor. 

A própria literatura de negócios (?) classifica diversos tipos de inovação. Tentam colocar alguma ordem na morfologia da moda, definindo o que é uma inovação e o que também é, mas não tanto.

Inovação incremental, por exemplo, é aquela que não é bem uma inovação, sabe? Ela muda alguma coisa no produto e necessariamente deve (e aqui basta aplicar algum clichê) “agregar valor” ou “gerar vantagem competitiva”. Além disso, não pode ser apenas uma “melhoria contínua”. Tranquilo, né?

A inovação propriamente dita é então chamada de inovação radical. Aquela que desenvolve algo realmente novo, que gera uma ruptura, um recomeço. Uma imagem colorida na televisão. Um aparelho portátil que toca música aonde você for. Um telefone sem botões. Ou, aproveitando o tema do texto, uma câmera fotográfica que armazena milhares de fotos – e não utiliza filme.

Inovação, de fato, deveria ser algo que mudasse a vida das pessoas. E não apenas algo que as empresas consideram uma mudança. A banalização do termo banaliza o ato e, se bobear, todo o processo.

No entanto, se você escrever numa redação que o “selfie” é uma maneira inovadora de fotografar, vai tirar nota 10.

terça-feira, 3 de dezembro de 2013

Carros na ponte e cachorros na neve

Em Florianópolis algumas lojas ainda fecham ao meio dia. Numa confraternização (perdão pelo eufemismo, leitor) em um bar da ilha, concordamos todos que isso é uma evidência inequívoca de que a capital ainda é uma cidade pequena. Tudo é lindo e faz sentido nas teorias que nascem na mesa do bar.

De fato estamos com pressa, e muitas vezes o tempo que temos para resolver problemas é ao meio-dia. Logo, causa um espanto moderno essa pausa comercial de duas horas para o almoço, bem no horário do... almoço.

(Em tempo: Floripa aparenta ser um mercado pequeno, restrito. Poucos clientes, pouca estrutura. Mesmo assim tem despertado certo encantamento externo. Será que a ilha está sendo superestimada? Ou a métrica do progresso é o trânsito caótico?)

Voltando aos intervalos: pesquisadores já descobriram que 4 horas é o limite do esforço contínuo. Isso se aplica a qualquer atividade profissional, como atletas de alta performance e, com certa variação, em cachorros que puxam trenós na neve: tradicionalmente, nas competições, eles corriam em torno de 12 horas e descansavam 12. Estudos mudaram a estratégia: quatro a seis horas de corrida, com intervalos de descanso da mesma duração.

Pesquisadores notaram que o momento de maior produtividade é quando você está compenetrado. E essa atenção total à tarefa não pode ser mantida o dia todo. Após quatro horas, é humanamente impossível manter o mesmo nível de rendimento.

Em um dos textos mais lidos do mês no blog da Harvard Business Review, o autor Daniel Goleman relata em detalhes esses estudos e lembra: o cérebro cansado apresenta sinais. Irritação, fadiga, distração e dispersão: de repente você percebe que está no Facebook, curtindo a vergonha alheia, quando deveria estar produzindo.

Se comercialmente fechar ao meio dia é um problema para o cliente (e eventual prejuízo financeiro para o empresário), mentalmente pode ser um alívio. Não é apenas qualidade de vida poder ir para casa, almoçar, brincar com o cachorro, dormir meia hora: é cientificamente comprovado que essa pausa melhora o rendimento, no caso, da tarde.

Quem sabe Floripa, ou o que restou de Desterro, deva preservar essa tradição de cidade pequena. O problema é atravessar a ponte, almoçar e voltar abrir a loja em uma hora e meia. A teoria de bar, na prática, também é outra.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

O passado justificado

Numa das últimas edições da revista Veja, a cantora Anitta lembra do passado humilde. A filha de uma costureira e de um vendedor de baterias de carro lembra que ganhava R$ 150 por show (hoje o cachê passa de R$ 100 mil). Diz ela: “Eu ia para os bailes com a minha mãe, no Peugeot 206 do meu pai. Mas o carro teve de ser devolvido por falta de pagamento”.

Há alguns dias minha mãe lembrou de algo que eu havia esquecido: quando criança, entreguei jornal e vendi picolé. Ela acredita que essa experiência possa ter contribuído na minha formação e trajetória profissional. Vejamos.

Entreguei uma ou duas edições do jornal. Tive que pedir ajuda ao meu primo para vencer a entrega. Lembro do chefe me flagrar com a bolsa de jornais jogada no chão enquanto admirava a enorme coleção de bolitas (bolas de gude) de um amigo. Essa coleção era lendária: uma bacia de lavar roupas cheia, impossível de ser erguida. Leiteira, olho-de-gato, listradinha, bolitão comum e paraguaio: para uma criança, o jornal se tornava irrelevante diante de tamanho tesouro.

Com os picolés não foi diferente. Lembro de ter tombado o carrinho num pátio de areia. Gostaria de lembrar do rosto do cliente ao receber um picolé sujo. Meu ponto era próximo à quadra de esportes da escola: dali podia observar as partidas na sombra de uma árvore. 

Hoje, na primeira oportunidade, como num jantar chique, posso omitir os fatos e, com um olhar distante, afirmar: “Minha infância não foi fácil. Vendi picolé e entreguei jornal. Minha mãe é testemunha.”  

É comum os famosos enaltecerem suas origens humildes. Como sofreram para chegar aonde chegaram. E nós, anônimos ou indigentes, repetimos a mesma ladainha: enfeitamos o passado para dar mais graça ao presente. 

Quem não sofreu teve tudo de mão-beijada, por isso chegou lá. Quem não chegou lá mas sofreu usa como desculpa para o fracasso atual as adversidades do passado. E quem não chegou lá, sofrendo ou não, reclama da falta de oportunidades.

O futuro chegou, e o que ele trouxe? Um passado cada vez mais distante, cheio de glórias e desculpas. Mais nada.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Qual é o seu limite?

No filme “Tudo pelo poder”, Stephen Myers (Ryan Gosling, sempre avassalador) faz as relações públicas da campanha eleitoral do governador Mike Morris (George Clooney). Num certo ponto da trama, o governador está no banco traseiro de um carro, conversando com sua esposa. Ela pergunta o motivo de ele não aceitar uma aliança com certo senador, o que lhe daria grande vantagem. E ele explica que várias vezes já cedeu e passou do limite que ele tinha estabelecido: limites éticos e morais. Aceitar tal aliança seria demais.

Imagine que os seus valores são um terreno cercado. Ali dentro está o seu código de conduta: até que ponto você pode ir para alcançar aquilo que você quer. Teoricamente, mentir, roubar e matar são coisas impensáveis, estão além da cerca, do limite que você estabeleceu.

Mas o poder e a ganância podem fazer você flexibilizar os seus limites. O resultado que você quer exige que você faça algo que você não gostaria que seus pais soubessem. O filme mostra isso: você começa a aceitar pequenas infrações, elas se tornam hábitos e, quando você percebe, desapareceu a tênue linha entre o certo e o errado.

Há muitos anos, em um mercado em Curitiba, vi um senhor devolver uma pequena quantia em dinheiro para o caixa. A quantidade era quase irrelevante, alguns centavos. Mas ele se justificou: “É assim que começa”. Começa o quê?, pensei na época. Hoje creio que ele não arriscava ultrapassar seus limites. Mesmo que só alguns milímetros.

Ser flexível é uma virtude? Nem sempre. Mudar de opinião é uma coisa. Condicionar valores e princípios aos interesses em jogo é outra. O problema é que é do ser humano justificar seus atos de acordo com a consequência, com o resultado obtido.

Um dos lados do seu cérebro está sempre justificando suas atitudes. É mentira que o notório corrupto chora sozinho à noite. Ele mesmo se ilude, releva, encontra culpados. O cérebro inquieto faz esse trabalho sujo enquanto o coração, maricas, permanece calado.

Millôr - Paz da classe média

terça-feira, 12 de novembro de 2013

A educação dos cabelos

As brasileiras compram, em média, 15 frascos de xampu por ano. Elas dedicam 35 minutos diários arrumando o cabelo. O mercado desses produtos movimenta no país R$ 4,8 bilhões por ano. Esses e os demais dados do texto foram coletados em matéria da revista Veja.

Dificilmente o mercado de produtos para cabelo entrará em crise: os produtos tornaram-se uma necessidade básica. Na publicidade, o segmento já é o sexto maior anunciante, contando com garotas-propaganda como Gisele Bündchen, da Pantene, que recebe um cachê estimado em R$ 3 milhões. Cachê maior que o de Jennifer Lopes, da L’Oréal – aproximadamente USS 1 milhão. Além da boa grana, uma grande e lucrativa visibilidade: Gisele é disparada a mulher mais citada no Brasil como exemplo de beleza.

Estima-se também que as brasileiras coloquem mais xampu e condicionador nas mãos – mais do que o dobro que as europeias. Algo cultural, climático e, claro, relacionado ao tamanho dos fios.

Outro dado: 86% das mulheres brasileiras já usaram tintura nos cabelos. Segundo elas, um novo tom de coloração no cabelo aumenta a autoconfiança, dá sofisticação e melhora o humor.

Outro dado curioso, este da Revista Exame: o condicionador está presente em 91% dos lares brasileiros. Na Itália, em 50% das casas. Na França, só 35% dos lares possuem condicionador na janelinha do banheiro. 

O Brasil é o segundo mercado mundial em consumo de pós-xampus: os produtos usados após a lavagem. Novos processos, como o alisamento, demandam cuidados especiais. Logo, produtos de “manutenção” ganham mercado. Detalhe: mais da metade das mulheres brasileiras já fizeram algum tipo de alisamento.

E mais da metade das mulheres afirmam que deixam de sair se não tiverem tempo de arrumar os cabelos.

O Brasil ocupa a posição 85 no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) calculado pela ONU, logo atrás de Omã (84) e Azerbaijão (82). O índice mede a renda, a educação e a saúde dos habitantes de cada país. Já o Fórum Econômico Mundial classifica o Brasil na posição 88 no ranking de educação, logo atrás do Suriname (87) e da Bolívia (86).

Mas isso é outra história. Ou não?








terça-feira, 5 de novembro de 2013

O analfabeto moderno

O Instituto Paulo Montenegro, ligado ao Ibope, mede os níveis de alfabetismo da população brasileira adulta. A definição do instituto para um analfabeto funcional é a seguinte: “É a pessoa que, mesmo sabendo ler e escrever frases simples, não possui as habilidades necessárias para satisfazer as demandas do seu dia-a-dia e se desenvolver pessoal e profissionalmente.”

O termo soa ofensivo. Parece algo distante, não adequado para pessoas que seguram um jornal nas mãos, se comunicam diariamente na internet e disparam opiniões sobre os mais variados temas.

Pois então: segundo o instituto, aproximadamente quatro em cada dez universitários brasileiros são analfabetos funcionais. Eles sabem ler, formar algumas frases, assinar o nome na prova. Mas não possuem capacidade aceitável de interpretação. Avaliar, relacionar, ponderar, julgar – todas tarefas que exigem esforço hercúleo do aluno. Calcular, só se o professor explicar exatamente como usar a fórmula.

O analfabeto funcional ignora as entrelinhas: a ironia passa despercebida e pode ser interpretada como uma ofensa. A metáfora perde o sentido e ele se pergunta: por que essa historinha para depois falar de política? Ele ignora todas as nuances que tornam a comunicação uma forma de arte.

Insiste-se para que os alunos leiam mais, mas fica a pergunta: será que eles sentem aversão ao texto porque são preguiçosos ou porque não entendem nada? É cruel: a criança vira adolescente e passa mais de uma década em sala de aula – e mesmo assim não consegue se comunicar direito. O que não for literal, para lembrar a adorável professora, “vai entrar por um ouvido e sair pelo outro”.

Desse modo a faculdade, que deveria formar profissionais, precisa ensiná-los a ler. Não são todos, mas é quase a metade! Em consequência disso, a graduação não pode exigir demais dos alunos. Para que todos aprendam, o ensino acaba sendo nivelado por baixo.


Esse efeito dominó vem da base. Suas consequências são sentidas de modo avassalador na economia e no mercado de trabalho. Uma pergunta para aqueles que tem uma visão de mundo limitada e singela: será que só aumentar o salário do professor resolve?

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Enquanto o caos não chega

Há alguns anos (6, 7 anos talvez) escrevi um texto sobre uma aparente habilidade que eu possuía para escrever textos de autoajuda. O texto se perdeu, mas ele era concluído com alguma brincadeira semântica, mostrando que mais uma vez eu havia escrito um texto nesse estilo, digamos, pobre.

E o que é um texto de autoajuda? Basicamente, é a filosofia barata que prolifera no Facebook: pequenos textos ou frases que afirmam que você pode se você quiser porque você é único e especial. Basta você não ter medo, acreditar em si mesmo e agarrar a felicidade. Tudo simples assim.

Existe autoajuda de qualidade? Decerto: aquela baseada em estudos científicos e pesquisas sérias que orientam pessoas e profissionais a agir. Arrisco dizer que a autoajuda de qualidade desvenda o cérebro cientificamente. Enquanto a autoajuda picareta assume a pretensão de resolver os mistérios do coração – até a definição é parca.

Para essa autoajuda rasteira, não ser feliz é uma questão de preguiça ou de incompetência. Fico aqui imaginando o quanto essas frases bonitas e vazias esfregam todos os dias na cara do incauto: “você é infeliz e a culpa é sua!”

Enquanto isso, sobrevivemos rezando para que o caos não chegue hoje. Já pensou, leitor, quantas desgraças poderiam acabar com a sua vida amanhã? Um ente querido partir, uma doença grave aparecer. Esses lances que ninguém sabe se é coisa do acaso ou providência divina.

Ao mesmo tempo, leitor, pense em quanta coisa irrelevante comparada às tragédias tiram o seu sono. Seria o único motivo plausível para entender racionalmente um desastre: mostrar a sua irrelevância e o quanto você se preocupa com bobagens. Parece necessário um problema de verdade para deixar de ser um adolescente mimado e chorão.

Nesse meio-tempo, busco um texto mais informativo e que, por si só, indique uma eventual mudança de postura. Mas qualquer leitor atento pode perceber que na maioria das linhas eu aconselho, advirto, sugiro que as pessoas ou empresas façam algo de tal maneira. Eis o “dom” que eu previa se manifestando: um escritor de segunda linha com a pretensão de escrever o que as pessoas devem fazer.  É meio involuntário: quando percebo, lá está a moral da história. 

E no capítulo de hoje, vimos que não se deve perder tempo com o que não é relevante. Até semana que vem, caro leitor!

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Sobre trabalhar demais

Existe uma pergunta que todo professor já respondeu: “Você também trabalha ou só dá aula?”.

Professores utilizam comentários assim para exemplificar o quanto são injustiçados: a nobre missão de educar não é considerada um trabalho completo. 

Não vou sair em defesa dos colegas. Não gosto desse discurso que representa uma “classe” inteira: igualar profissionais de uma mesma categoria é uma ofensa aos melhores e um refúgio aos medíocres – e isso vale para qualquer atividade profissional. Quem generaliza, no caso dos professores, provavelmente há tempos não entra numa sala de aula.

Minha questão é outra: O que pretendem os que trabalham tanto? De que maneira seu esforço está contribuído com os seus objetivos? Ou mais dramático: quais são os seus objetivos?

Entendo que muitas pessoas não possuem opção e precisam trabalhar para suprir necessidades básicas. Mas falo daqueles que já tem o que precisam para viver e continuam trabalhando feito condenados.

Trabalhar tanto traz dignidade? Pode ser. É uma filosofia de vida de origem religiosa e cultural muito forte, algo já abordado neste espaço. Mas se é para ser pragmático, pergunto: o que todo esse sacrifício está construindo? Será que gastar todo esse tempo e energia trabalhando é realmente necessário?

A intenção desse raciocínio não é criticar ninguém. Se você trabalha sem parar é problema seu. Mas acho que todo profissional pode refletir se o que ele está fazendo é de alguma forma edificante. É possível avaliar frequentemente seus resultados.

Sugiro conversar com as pessoas. Se você ouvir, elas irão dizer o que pensam das suas mãos calejadas. Das dores nas costas. Da sua falta de tempo.

E se você trabalha muito agora para um dia ter mais tempo livre, cuidado: dificilmente esse dia vai chegar, a não ser que você defina uma data, um prazo, um número, uma cifra. Algo que você possa medir e acompanhar.

Só mais uma reflexão para concluir: pense no que você construiu de importante nos últimos cinco anos. Se continuar trabalhando da mesma maneira nos próximos cinco, os resultados serão diferentes?

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Listas de tarefas não funcionam

Leitor: você é organizado e faz uma lista com as atividades do dia, da semana?

Segundo o autor Daniel Markovitz, em texto no blog da Harvard Business Review, é preciso parar de fazer essas listas (to do lists, em inglês). Elas contribuem apenas, segundo ele, para frustração e fracassos. Como isso acontece?

Primeiramente, algo já abordado neste espaço: o paradoxo da escolha. Depois de listar suas tarefas, você precisa então escolher qual delas fazer primeiro. E aquelas que você deixou para depois geram um certo custo de oportunidade perdida: você realiza uma tarefa pensando nas outras.

O autor lembra algo que já deve ter acontecido com você, leitor: você tem tanta coisa para fazer que simplesmente trava e não sabe por onde começar. Então você passa uma hora no Facebook ou com a TV ligada, divagando. 

Em função da grande diferença entre as tarefas, coloca-las numa mesma lista gera confusão e essa espécie de paralisia. A tendência é que você execute tarefas mais simples antes das demais: isso porque há uma recompensa psicológica ao ver um item ser riscado da lista. Só que a sua psicologia nem sempre avalia a importância do que precisa ser feito. E algumas tarefas mais complexas ou demoradas provavelmente serão adiadas. 

Além disso, se a sua lista de tarefas inclui itens de diversas prioridades, você vai resolver o que é urgente, e protelar o que não é para hoje: até se tornar urgente também. O grande problema: no papel, todas as tarefas parecem iguais. Falta um contexto para saber em qual trabalhar antes ou a qual dedicar mais tempo.

Para o autor, a única solução é programar o quanto cada tarefa vai demorar, e especialmente quanto tempo você tem para realiza-la. Suas atividades precisam ser dispostas no calendário. Só assim você pode transformar uma lista homogênea em algo tangível, onde estão estabelecidos os recursos necessários para realizar cada uma (tempo, local, urgência, etc).

Ou seja: listar tarefas é apenas a primeira etapa de um planejamento. É necessário, além dessa lista, definir qual será feita em cada horário, de acordo com prioridades e conveniências. Não deixe que a nobre missão de programar o seu dia se transforme em algo contraproducente.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

Uma ou duas metáforas sobre feedback

Você também repete por aí aquele ditado que diz que se conselho fosse bom não seria de graça?

Ha alguns dias, na sala de aula, falávamos sobre como um pequeno detalhe pode dar indícios de um cenário empresarial. Aquela metáfora da ponta do iceberg: enxergamos uma pequena parte sobre a água, e desconfiamos da enormidade submersa (na verdade eu nunca vi um iceberg, mas alguém já viu e disse que é assim. O Titanic também não viu).

Empresas e pessoas também se revelam assim, em leves evidências. São pistas que indicam como as coisas realmente são, como elas funcionam rotineiramente. Alguém pode afirmar que é errado julgar algo ou alguém assim, com base apenas em pequenos detalhes. Mas é assim que o mundo gira: ou você se indigna ou se adapta.

É essa a maneira como avaliamos os outros: com base em pequenas características construímos juízos definitivos. Uma frase marca a vida inteira. Não há tempo para parar e avaliar detalhadamente: uma imagem é construída e desconstruída em um gesto, na primeira e avassaladora impressão.

E aqui retomamos o clichê que abriu este texto. O conselho pode não ser bom, mas é necessário. A única maneira de você evoluir como profissional e como pessoa é ouvindo palpites, sugestões, comentários. Quem sabe você esteja sendo julgado por um detalhe que você ignora.

O problema é que as pessoas não costumam reclamar. Elas percebem defeitos, erros ou problemas e ficam caladas: temem conflitos e a reação do criticado. Ou não se manifestam porque, afinal, não vale a pena. Ninguém vai ouvir. E assim passamos a vida avaliando e julgando em surdina.

O segredo do sucesso existe, mas demanda um esforço tremendo: é preciso incentivar a sugestão. Apenas agradecer eventual conselho não é suficiente: implore para ser criticado, por mais que o orgulho seja ferido, e por mais tendenciosa que a crítica seja – depois você avalia o que deve ou não ser considerado. Mas é preciso, como se diz por aqui, “ouvir umas verdades”. Por mais que você se avalie, sem o ponto de vista externo você não vai conseguir crescer.

Você não é especial. Um número de pessoas muito inferior ao que você imagina se preocupa com você. Este planeta é um grande orfanato, e a melancolia deveria nos unir a todos. Se o Pai não responde as suas preces, ouça o que os seus irmãos bastardos tem a dizer sobre você.

O pôr-do-sol, é certo
Já não me toca
Tão de perto.
Millôr

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Os introvertidos – parte 2

O maior desafio de um introvertido é, desde criança, adaptar-se ao mundo: nossas escolas, faculdades e empresas são moldadas para pessoas extrovertidas. O introvertido tem trabalho dobrado: precisa estudar, aprender, trabalhar, evoluir como qualquer pessoa. Mas, além disso, precisa aparecer, interagir – precisa se comportar como um extrovertido.

As empresas estão derrubando as paredes e colocando as pessoas para trabalhar cada vez mais próximas. Em qualquer instituição de ensino, o trabalho em equipe é a regra. Mesmo que, em geral, cada aluno faça uma parte e apresente um pouquinho lá na frente da sala. A métrica de avaliação é a participação.

Professores consideram bons alunos os extrovertidos. Prestar atenção e ir bem na prova não basta: é preciso participar e opinar, mesmo que seja uma bobagem – de acordo com os critérios atuais de avaliação, é melhor do que ficar calado.

A mesma situação ocorre com os departamentos de recursos humanos. As qualidades mais valorizadas são a habilidade de se comunicar e o tal relacionamento interpessoal. Sem falar, claro, na capacidade que o profissional tem de se promover, de se “gabar”: caso contrário, como saberíamos das maravilhas que ele já realizou?

Nesse cenário onde o melhor é o que aparece mais, o introvertido assume um objetivo paralelo ao desenvolvimento pessoal: conseguir ser visto, notado, ou simplesmente ouvido. 

A dúvida: será que é realmente necessário que o introvertido se transforme num extrovertido? Será que não perdemos tempo (e dinheiro) tentando que ele seja outra pessoa para só então aproveitar suas habilidades cognitivas? Já se sabe, por exemplo, que as ideias podem nascer no isolamento, e só depois serem submetidas ao escrutínio de um grupo. 

Talvez fosse mais simples deixar que ele encontrasse a melhor maneira e o melhor ambiente para produzir mais e melhor. O esforço atual das escolas e do trabalho (e até das famílias) é adapta-lo a um padrão de comportamento. Ou é realmente impossível ensinar alguém que fala menos e reflete mais? Existem estudos sérios que apontam isso?

Essa necessidade de exposição é opressiva para quem é recluso. E é contraproducente num cenário carente de resultados. Quem sabe seja o momento de repensar essa tara de querer moldar as pessoas. Desconfio que existam coisas sensacionais que não estão sendo ouvidas: estamos gritando demais. E eles falam baixinho.

terça-feira, 24 de setembro de 2013

Os introvertidos – parte 1

Carl Jung tornou famoso o conceito de extroversão e introversão. Ninguém é 100% um ou outro: você se encontra em algum ponto entre os opostos. E dependendo da situação, as pessoas se comportam de modo mais sociável ou de modo mais reservado.

Um exemplo: lembra daquela pessoa que vivia incomodando no Facebook e de repente desapareceu? O que pode ter havido?

No livro “O poder dos quietos” a autora Susan Cain questiona esse nosso desejo de querer parecer extrovertido o tempo todo. 

A autora traça um paralelo histórico: quando a vida acontecia no campo, onde todos se conheciam, o importante era desenvolver o caráter: ele que gerava respeito e admiração da pequena comunidade. Com a formação de cidades e grandes centros, a questão é ter uma personalidade que encante a multidão. Ser extrovertido virou pré-requisito do sucesso.

Segundo a autora, pelo menos uma em cada três pessoas nos EUA são majoritariamente introvertidas. São pessoas que preferem ambientes calmos ou momentos de solidão para fazer aquilo que gostam. Elas evitam os holofotes.

No entanto os extrovertidos são mais admirados: eles desfilam nos palcos do mundo (real e virtual), conversam com qualquer um, não se inibem diante de olhares estranhos. E o introvertido se sente culpado por não conseguir se comportar dessa maneira. Às vezes até acredita que há algo de errado com ele. Pior: as pessoas falam que ser assim, reservado, é um problema. Uma barreira a ser superada para ser feliz.

Por isso o introvertido não "se assume". Ele sente que destoa do padrão comportamental moderno. Criam-se, assim, introvertidos enrustidos, que escondem dos outros e negam a si mesmo aquilo que são: socialmente inseguros talvez, mas reflexivos, sensíveis, criativos, estratégicos. Escondem no fundo de sua personalidade qualidades notáveis porque não são essas as qualidades que eles almejam.

E a pessoa que sumiu do Facebook? Aquela personagem virtual não era ela: era apenas um avatar implorando para ser percebido. Mas chega um momento em que o falso extrovertido percebe que sua personalidade não deveria ser construída socialmente: essa é uma reflexão solitária. 

Quem sabe um introvertido possa ajuda-lo.


Obrigado, leitor!



terça-feira, 17 de setembro de 2013

O paradoxo da escolha – parte 2

Há alguns dias um amigo relatou a experiência exaustiva de escolher um presente para uma criança. A quantidade de modelos de brinquedos complicou a decisão de compra: e se ela não gostar? E se ela já tiver um desses? E se eu comprar um barato, o que os pais vão pensar?

A revista Época, na matéria “Escolha menos e viva melhor”, traz uma experiência da Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos: 58 pessoas que faziam compras em um shopping foram convidadas a resolver problemas matemáticos. O resultado: aqueles que visitaram mais lojas antes dos testes tiraram as piores notas e se concentraram menos. Se a dúvida nos consome em casa ao provar roupas em frente ao espelho, imagine o esforço mental quando é preciso escolher e pagar pela roupa nova.

Dizem que Barack Obama tem disponível apenas duas opções de terno para trabalhar: cinza e azul-escuro. E além do roupeiro simplificado, ele conta com centenas de assessores para decidir questões menos relevantes. Em entrevista à revista Vanity Fair ele afirmou o seguinte: “Já tenho decisões demais para tomar ao longo do dia. Você precisa dar foco a sua capacidade de escolher. Precisa criar rotinas. Não pode levar o dia distraído por questões menores.”

Segundo os especialistas ouvidos pela revista Época, também precisamos encontrar pessoas que possam tornar a nossa rotina mais automática. Se para você é um dilema escolher um modelo de celular, para algum amigo ligado em tecnologia será um prazer. Se você confiar nas decisões das pessoas, além de fortalecer o laço afetivo, poupará tempo e capacidade de raciocínio. Tanto na vida pessoal como no trabalho.

E mais: perdemos muito tempo hesitando entre alternativas equivalentes. Se você comparar o provável resultado de duas ou mais opções, na maioria das vezes não terá como medir. Aonde ir, o que comer, o que vestir, o que fazer, o que falar, o que escrever: você não consegue, de antemão, calcular as consequências e avaliar a satisfação. Mas mesmo assim fica exausto de tanto pensar em como agir.

O mais grave da quantidade de escolhas da vida moderna não é a perda de tempo: é o esgotamento mental. Lembre-se: o poder decisório do ser humano é limitado. Se você não priorizar o que é importante, vai continuar a matutar se escolhe a picuinha ou o mesquinho. E depois de escolher, vai se sentir arrependido e cansado.



terça-feira, 10 de setembro de 2013

O paradoxo da escolha – parte 1

Eu já havia decidido o tema deste artigo: escreveria algo sobre os estudos do psicólogo Barry Schwartz, e seu livro “O paradoxo da escolha”. Já havia assistido a sua apresentação no TED Talks e anotado alguns tópicos.

Recebi então a última edição da revista Época e encontrei a excelente matéria “Escolha menos e viva melhor”. Então fiquei pensando se manteria o texto original, se mudava a abordagem e acrescentava informações, ou se desistia do texto. Ponderei, refleti, e eis o texto modificado.

Uma situação simples como essa resume a ideia de Barry Schwartz: temos tantas opções e tanta informação que, consequentemente, nos deparamos com inúmeras escolhas. Segundo o psicólogo, isso gera certa paralisia: travamos diante da possibilidade de optar pelo errado. A vida moderna é uma encruzilhada constante.

O mais grave, de acordo com o psicólogo, é que mesmo optando por uma decisão razoável, estaremos nos perguntando: e se eu tivesse ido por outro caminho? Tentamos, em vão, medir como seria a satisfação se nossas escolhas tivessem sido outras. Esse dilema vale para as decisões mais importantes da vida e também para as mais corriqueiras, como que roupa usar, o que comer, aonde ir.

E para tentar evitar as decepções, dedicamos um tempo enorme avaliando alternativas. No entanto, nossa capacidade de decisão é limitada. Se você começa o dia pensando demais no que fazer, ficará exausto antes do meio dia (texto da próxima semana).

Outro problema: a quantidade de opções disponíveis aumenta também as nossas expectativas. Havendo tanta opção, pensamos, por exemplo, que um dia há de aparecer a cara-metade, a alma-gêmea. Casar no passado era mais simples porque as opções eram limitadas. Hoje, devido à possibilidade de escolha, sua expectativa está nas alturas – e esse alguém será tudo o que você imagina? Escolher sempre será frustrante, pois carregamos o peso do que rejeitamos.

Eis o paradoxo da escolha: mesmo depois de decidir, você lamenta o que descartou. Mas continua imaginando que a felicidade mora numa decisão acertada.  


terça-feira, 3 de setembro de 2013

Brasil 2042

Quando eu completar 60 anos, o Brasil atingirá seu ápice populacional: seremos (se Deus quiser, e “claro que Ele vai querer”, como dizia um amigo de infância) 228,35 milhões de pessoas. Isso acontecerá no ano de 2042. Em 2043, segundo a projeção do IBGE, teremos, pela primeira vez na história do país, mais velórios do que partos. Hoje, a população do Brasil é estimada em 201 milhões de pessoas.

O cálculo do IBGE pode mudar um pouco. A última projeção, divulgada em 2008, apontava que o ápice aconteceria em 2050. O principal fato que ocasionou a redução do prazo de atingimento do ápice (pareço falar de uma meta, não?) foi a diminuição do tamanho das famílias. Hoje, no Brasil, as mulheres se tornam mães, em média, aos 27 anos,  e a taxa de fecundidade é de 1,77 filho por mulher. A tendência é que as mulheres adiem cada vez mais a gravidez: em 2030, segundo a projeção, a idade média no momento do parto será de 29,3 anos.

O que mais impressiona (e preocupa) é o envelhecimento da população. Em 1950, existiam 52 milhões de brasileiros e a expectativa de vida era de 43 anos (idade do jovem pós-moderno, digamos). Já a taxa de fecundidade nos anos 1950 era de 6 filhos por mulher (Reflita: quantos tios você tem? E você é tio de quantos?).

A expectativa de vida hoje é de quase 75 anos. Santa Catarina será o primeiro estado a alcançar a expectativa de vida de 80 anos, lá por 2020. A média nacional só deve chegar nesse patamar em 2040.

Em 2060 o Brasil terá 5 milhões de idosos com mais de 90 anos. Hoje esses longevos não somam 300 mil. As consequências do envelhecimento da população ficam evidentes em dados como este: hoje, cada 100 pessoas que trabalham “sustentam” 46 que não trabalham (crianças, aposentados). Em 2060, a proporção será de 100 pessoas sustentando 66. 

Não podemos esperar por utopias como a reforma da previdência. Precisamos agir: poderíamos incentivar o crescimento das famílias. E que tal importar chineses e indianos excedentes? A propósito, os cubanos já estão chegando.