quarta-feira, 30 de abril de 2014

Sonho grande – e em família

Li em uma pegada (tá, foram 3 ou 4) o livro “Sonho Grande”, da jornalista Cristiane Correa, que narra a trajetória de Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira. Eles são os empresários que, entre outros feitos, criaram a Ambev e recentemente compraram a Budweiser e o Burger King. O segredo: recrutando e premiando o desempenho dos profissionais mais talentosos e dedicados do mercado. A cultura organizacional agressiva baseada na meritocracia mudou a mentalidade empresarial brasileira, exercendo influência também em outros continentes.

Vários pontos do livro são excelentes insights para qualquer pequeno empresário. Destaco um: a dramática decisão de os parentes serem os herdeiros naturais dos melhores cargos de uma empresa familiar.

Os três empresários, somados, possuem 11 filhos. Há tempos determinaram uma regra: os filhos dos sócios são proibidos de trabalhar nas empresas do grupo.
Como são herdeiros da fortuna, alguns até atuam, por exemplo, no conselho de administração de algumas das empresas dos pais. Lá acompanham as decisões estratégicas das empresas, mas não interferem na gestão.

A autora relata o dia em que Marcel Telles contou ao filho que ele não poderia trabalhar na Ambev. O menino, então com 11 anos, ficou encantado com os comentários que ouviu sobre a empresa e disse ao pai que seria muito legal trabalhar lá no futuro. Marcel Telles então questionou o filho: quantas pessoas boas teríamos perdido se pudessem entrar familiares na empresa? 

A lógica é simples: favorecer familiares é um golpe fatal na meritocracia. Promover parentes sem habilidades de negócio afeta a organização em todos os sentidos. Além do perigo dos desastres financeiros, uma certeza é ainda mais grave: a empresa nunca vai conseguir reter funcionários talentosos, porque eles sabem que os postos mais altos são exclusivos da família – não importando o quão incompetente a parentada seja. É um ciclo da ineficiência que se propaga – e que inconscientemente é estimulado.

Pergunta: será que é possível preparar a empresa para ser tocada pelo filho? Ou é melhor preparar o filho para eventualmente (se demonstrar competência e mérito) dar continuidade nos negócios?

É uma miopia bastante comum: os proprietários favorecem parentes para que o negócio continue na família. Essa é a receita clássica para não perder a empresa – o que a família não sabe é que, com essa metodologia, a probabilidade da empresa se perder aumenta a cada geração.